“A maioria dos ninhos [das gaivotas] encontra-se no centro histórico do Porto, em locais mais degradados e antigos, inclusive em edifícios devolutos, mas a espécie gaivota-de-patas-amarelas parece estar a alargar cada vez mais a sua área de reprodução, usando prédios e casas bastante recentes”, avançou hoje à Lusa Joana Faria, autora da tese de doutoramento “Gaivotas urbanas e o ser humano, uma relação cada vez mais complicada” e que conta com o apoio da Sociedade Portuguesa de Estudo das Aves (SPEA).
A espécie gaivota-de-patas-amarelas tem uma grande capacidade de adaptação a novas condições e está em constante período de experimentação, ou seja, os comportamentos de “tentativa e erro” são comuns e enquanto a gaivota tiver sucesso nessas tentativas vai aprendendo a repetir as mesmas estratégias de ano para ano.
“É importante manter a noção de que é um animal selvagem como os restantes que temos neste planeta, apenas se encontra a explorar um novo ‘habitat’ que lhe fornece relativa vantagem”, diz a especialista.
Outra das conclusões preliminares da tese prende-se com a última época reprodutiva (primavera) das gaivotas, que foi “um pouco anormal” em relação ao período homólogo, facto que a investigadora justifica com a “instabilidade climática”.
“Alguns casais reprodutores estavam bastante adiantados na primeira postura de ovos, comparativamente a outros que realizaram a primeira postura mais tarde, dando a possibilidade aos primeiros de realizar uma segunda postura, que é comum nesta espécie”, avança a especialista.
As gaivotas que habitam no Porto tanto se alimentam de queques e carne na baixa da cidade, como comem peixe ao longo do rio Douro, da foz até ao Pinhão (Vila Real), e vão à lota de Matosinhos, indica o mesmo estudo, que teve início em maio de 2018 e deverá ficar concluído no final do ano.
O estudo, que se concentra na monitorização de cinco gaivotas adultas através de GPS, prevê uma contagem mensal num total de 36 pontos da região Norte, desde Vila Nova de Gaia ao Porto, em locais como a Rua de Santa Catarina, Ribeira e Torre dos Clérigos, até Leça da Palmeira, em Matosinhos, passando por zonas ribeirinhas, costeiras, parques verdes e zonas urbanas.
“O objetivo é perceber que tipo de ‘habitat’ frequentam e a sua variação ao longo de um ano”, conta a investigadora, referindo que as gaivotas que habitam no Porto fazem “viagens longínquas” e mudam as dietas quando chega o momento de alimentar as crias, passando a comer mais peixe.
Análises ao regurgito das aves revelam, todavia, que também comem vidros, metal, plástico, queques e ossos.
Outros dos impactos negativos do aumento da população das gaivotas são o ataque a outras aves, como os juvenis de andorinhas-do-mar, e um aumento da poluição sonora com os chamamentos e cantos, bem como colisões com aeronaves na descolagem e aterragem e a perturbação no usufruto das áreas de lazer, sendo frequente o roubo de comida das mesas de esplanadas.
Segundo a SPEA, o aumento de ataques de gaivotas no Porto pode explicar-se com o crescente número de restaurantes perto do rio Douro, uma consequência do aumento da procura turística naquela área.