Num ano, em que a Câmara Municipal de Lisboa está renovar a imagem da frente riberinha da capital portuguesa, após um investimento de 18 milhões de euros, o MAAT – Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia, em Lisboa, conjuntamente com o Departamento de Arquitetura e Urbanismo [DAU] da Universidade Lusófona, promoveram, recentemente, um debate sobre o futuro desta linha que separa a cidade do rio Tejo.
Projetar este “ecossistema de transição” num espaço temporal de 30 anos, num quadro de alterações climáticas, foi o mote principal para uma iniciativa que encontrou mais dúvidas do que certezas, mas que se traduziu numa reflexão importante sobre o trabalho que tem sido desenvolvido nos últimos anos.
Para falar desta temática, o MAAT convidou Aurora Carapinha, Arquiteta Paisagista e Professora Auxiliar da Universidade de Évora, Tiago Pitta e Cunha, Presidente Executivo da Fundação Oceano Azul; João Favila Menezes, Arquiteto, Docente da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa; e Pedro Pinto, Engenheiro do Território, Investigador do Instituto Superior Técnico, numa conversa moderada por Pedro Ressano Garcia, arquiteto e director do DAU.
Lisboa, cidade de água
“Uma linha de história e identidade “, é nesta perspetiva que inicia a sua intervenção Aurora Carapinha, realçando o facto de Lisboa ter nesta frente ribeirinha um espaço de “importância imagética”, que “requer por isso, uma intervenção adequada”.
Por seu lado, o arquiteto Favila Menezes realçou o facto da “história da cidade de Lisboa ser uma sucessão de aterros”, que ao longo dos anos foi modificando a imagem da frente ribeirinha. Ainda assim, considera que no caso da capital portuguesa, esta não existiria sem um porto, condição indissociável face à economia gerada por essa mesma infraestrutura.
De costas viradas para o Tejo
A verdade é que, Lisboa ganhou precisamente importância como cidade-porto, salientou Pitta e Cunha, que considera que nos últimos anos, Lisboa tem deixado de ser vista como cidade portuária. “Estamos a anos-luz de tirarmos valor da zona riberinha”, lamenta o Presidente Executivo da Fundação Oceano Azul, que defendeu ainda que a capital deve promover uma maior ligação à frente ribeirinha.
“As alterações climáticas são apenas uma consequência daquele pensamento do domínio da natureza pelo homem”, defendendo que deve existir uma “profunda mudança filosófica”. “Nós estivemos de costas viradas para o Tejo nos últimos 40 anos. Agora teremos que criar uma nova relação com o Tejo, através da ecologia”, conclui.
Numa visão mais orientada para as mudanças que se vão verificar nos próximos anos, Pedro Pinto, Engenheiro do Território, Investigador do Instituto Superior Técnico, começou por explicar que à semelhança da baía de São Francisco, nos Estados Unidos, também Lisboa poderá vir a ter problemas com o aumento do nível na água do mar.
Além disso, o investigador explicou também um pouco do que tem sido a história da cidade de Lisboa, ao longo de séculos, num processo que tem sido marcado pelo “combate contra o rio para exploração agrícola”.
“Não sei se toda a gente tem esta noção, mas o estuário do Tejo está a ser transformado numa lezíria há mais de dois mil anos”, frisou Pedro Pinto, partilhando da visão de um domínio da natureza pelo homem. Quanto à frente ribeirinha, o responsável realçou o perigo das inundações na baixa deixando um alerta final: “pela primeira vez, nós teremos que abdicar de alguma coisa para termos hipóteses de sobrevivência, no sentido, de não termos que deslocalizar Lisboa para uma zona interior. Queremos preservar o centro histórico de Lisboa? Se sim, temos que pensar no que é que estamos dispostos a abdicar para preservar a frente ribeirinha”.
*Este artigo foi publicado na Ambiente Magazine 75.