Especialistas apelam a maior coordenação ibérica na gestão do Baixo Guadiana
A captação de água do Rio Guadiana não pode ser feita, por Portugal ou por Espanha, sem ambos os países estarem coordenados entre si e sem conhecerem as reais disponibilidades do rio, principalmente numa zona que sofre de escassez. O alerta foi dado, esta quinta-feira, 28 de abril, pela ANP|WWF e pela WWF Espanha, no seminário Cooperação transfronteiriça, usos e escassez de água no Baixo Guadiana.
Neste seminário, promovido pelas associações, vários especialistas apelaram aos Governos dos dois países para que haja uma “melhor coordenação na gestão das águas partilhadas, em particular no troço fronteiriço final”, e para que “estabeleçam legalmente”, no âmbito da Convenção de Albufeira e dos Planos de Bacia, as “reais exigências ecológicas de caudais e as efetivas disponibilidades para captações de água a partir do Rio Guadiana”.
“A proteção e melhoria dos rios, zonas húmidas e aquíferos do Algarve e de Huelva devem ser prioritárias para poder compatibilizar os objetivos ambientais com o desenvolvimento socioeconómico desta região transfronteiriça. Até que esta condição se cumpra, o Guadiana e o seu estuário continuarão a sofrer as nefastas consequências da falta de coordenação na gestão das águas partilhadas pelos dois países”, declara Afonso do Ó, especialista em água e clima da ANP|WWF, citado num comunicado.
Para este especialista, “não assegurando o cumprimento de um regime de caudais ecológicos efetivo no estuário, estaremos a hipotecar serviços dos ecossistemas tão importantes quanto a gestação e criação de muitas espécies piscatórias, a alimentação em sedimentos das praias nas costas do Algarve e da Andaluzia, ou a sobrevivência das galerias ripícolas que nos protegem de cheias e secas”.
O rio Guadiana nasce nas lagoas de Ruidera em Espanha, desenvolvendo-se ao longo de 810 km até à foz, no oceano Atlântico, junto a Vila Real de Santo António. A bacia hidrográfica do Guadiana, da qual 83% se situa em Espanha e 17% em Portugal, é uma das bacias com maior regulação hidráulica da Península, incluindo algumas das maiores barragens e albufeiras da Europa, como La Serena ou Alqueva. Mais de 80% da água captada destina-se ao setor agrícola, tanto em Portugal como em Espanha.
Ao abrigo da Convenção de Albufeira, que regula a utilização de água nas bacias partilhadas pelos dois países, foram definidos regimes de caudais mínimos trimestrais e anuais na passagem de cada rio pela fronteira. No entanto, “tal não foi acordado no local onde o Guadiana volta a ser fronteira – no Pomarão/Chança – o que, nos termos da Convenção, deveria ter ocorrido até 2002 para gerir a situação ambiental do Estuário do Guadiana”, referem as associações, no mesmo comunicado.
Ao invés, de acordo com as organizações, Espanha já capta água do Guadiana e prepara-se para reforçar as captações diretas na foz do Chança, para abastecer os regadios intensivos de Huelva. Por seu lado, Portugal prepara uma nova captação a montante do Pomarão para abastecer idênticos regadios intensivos no Sotavento Algarvio. A NP | WWF e a WWF Espanha defendem, portanto, a necessidade de Portugal e Espanha reverem o regime de caudais da Convenção de Albufeira, de modo a garantir caudais ecológicos efetivos e impedir novas captações antes de se conhecerem as reais necessidades e disponibilidades do Rio: “Tais disponibilidades devem assegurar uma prévia e efetiva avaliação dos seus impactos ambientais e garantir o cumprimento dos objetivos ambientais de melhoria das massas de água assumidos por ambos os países, em cumprimento da Diretiva-Quadro da Água europeia”, rematam.