A nova rubrica da Ambiente Magazine dá a conhecer projetos que participaram no programa EDP Energia Solidária, organizado pela Fundação EDP. Com o objetivo de apoiar ideias inovadoras e de cariz social, a iniciativa apresenta a Super Horta, pelas palavras do Pe. Luís Ferreira do Amaral, da Paróquia de S. Francisco Xavier de Caparica.
No que consiste o projeto?
O nosso projeto é um projeto-piloto que pretende confirmar a exequibilidade de se adaptar um contentor marítimo para nele instalar um sistema modular e autónomo de ‘aquaponia’, que permita a produção intensiva de hortícolas, em conjunto com a criação de peixe (a ‘aquaponia’ conjuga a ‘hidroponia’ – crescimento de plantas em meio líquido – com a ‘aquacultura’ – criação de peixes em espaços delimitados).
Além de transportável e facilmente replicável, o sistema deverá ser totalmente sustentável e amigo do ambiente, já que se baseia na simbiose natural existente entre plantas e peixes, resultando em benefício e crescimento de ambos.
Com muito reduzido consumo de recursos – incluindo de água -, prevemos que este modelo inovador de aquaponia-num-contentor possa vir a produzir alimentos com uma eficácia e produtividade muito superiores às dos métodos convencionais (podendo recorrer ao uso de luz artificial para acelerar a fotossíntese das plantas). O sistema não envolve, porém, risco algum de exaurir ou causar danos ao solo, ocupando apenas uma pequena área: a área do respetivo contentor.
Construímos então um protótipo para averiguar da eficácia deste novo conceito modular de ‘aquaponia-num-contentor’. Ao fim de 24 meses faremos a avaliação final deste projeto-piloto.
A quem se destina?
O nosso projeto destina-se a pessoas que vivam em locais onde a produção de alimentos (particularmente de alimentos frescos e saudáveis) seja inexistente insuficiente para as pessoas que aí habitam. Tendo eu trabalhado por alguns anos em Campos de Refugiados, pude testemunhar em primeira mão as grandes dificuldades em alimentar um grande número de pessoas que se encontrem em condições precárias. O campo de Kakuma no norte do Quénia, por exemplo, está situado numa região desértica, contando com mais de cem mil refugiados. Quando eu estava lá, a cada duas semanas um comboio com de camiões carregados de produtos alimentares tinha de vir desde o porto de Mombaça, a 1.200km de distância. Esses produtos alimentares tinham já sido transportados por navio do estrangeiro até esse mesmo porto. Não é difícil de concluir que uma tal solução terá necessariamente de envolver avultados custos, quer em termos financeiros, quer em termos de danos para o meio-ambiente.
Sabemos bem que a instalação de um contentor (ou mesmo de vários contentores) Super-Horta num Campo de Refugiados como o de Kakuma não irá resolver o problema da alimentação das pessoas que, infelizmente, são obrigadas a aí viver. Porém, poderá certamente atenuar esse problema – além de que poderá providenciar produtos alimentares frescos e saudáveis.
Além de Campos de Refugiados, acreditamos que o projeto Super-Horta poderá constituir também uma ajuda significativa em outros locais onde a necessidade de alimentos frescos, saudáveis e produzidos com um baixo custo, se faça sentir: por exemplo em bairros sociais (como é o caso do contentor deste nosso contentor-piloto); ou locais que possam eventualmente ter recentemente vivido alguma catástrofe e a quem a produção local de alimentação possa ser particularmente útil.
Os objetivos deste projeto são, pois, os seguintes:
a) Ajudar a combater a escassez alimentar de um modo eficaz, num mundo onde a fome é, infelizmente, ainda um grave problema para muitos seres humanos.
b) Reduzir os problemas ambientais e a ocupação do solo através de um sistema modular autónomo, que produz alimentos com muito baixo consumo de recursos (incluindo água), que não faz uso de pesticidas, que praticamente não recorre a fertilizantes, e que não produz resíduos.
c) Recorrendo a uma produção local, reduzir a emissão de gases poluentes devida ao transporte de alimentos do local onde são produzidos até ao local onde são consumidos.
d) Dotar populações de zonas desfavorecidas de um modo eficaz de auto-sustento. Sendo modular e autónomo, este sistema de aquaponia-num-contentor é facilmente replicável e transportável (pode ser montado num local com mais meios, sendo depois facilmente transportado para outro local, com recursos materiais e humanos mais limitados – por exemplo um Campo de Refugiados; e pode também ser supervisionado e controlado remotamente, através da internet).
e) Estimular o consumo de alimentos saudáveis, biológicos, frescos.
Qual a importância do projeto integrar o programa EDP Energia Solidária?
Temos bem presente que foi graças à Fundação EDP e ao seu programa EDP Energia Solidária que o nosso projeto-piloto se pôde tornar uma realidade. De facto, sem o apoio e o financiamento, não nos teria sido possível arrancar e concretizar esta ideia que, no futuro, poderá vir a representar uma ajuda significativa a pessoas em situação de necessidade, sem com isso causar dano ao nosso planeta.
Até ao momento, que financiamentos recebeu o projeto?
Além do financiamento da Fundação EDP, o projeto Super-Horta conseguiu, num segundo momento, obter também um financiamento por parte da Fundação Auchan. Estamos agradecidos a estas duas Fundações pois, graças às suas generosas contribuições, conseguimos obter a totalidade do que tínhamos orçamentado ser necessário para a montagem e instalação do nosso contentor-piloto.
Que resultados deste projeto podem ser divulgados?
Sendo um projeto-piloto de 24 meses, queremos, uma vez terminado esse período, divulgar os resultados em termos de produção alimentar: sua quantidade, qualidade, tempo médio desde a plantação até à colheita. Queremos também divulgar as necessidades de consumo do sistema (que, prevemos, se deverão resumir a pouco mais do que a comida para os peixes).
Tendo nós o desejo que o sistema seja também autónomo em termos de energia elétrica, depois de instalados meios de produção de energia renovável, queremos poder confirmar que tal é de facto possível (e qual a quantidade de meios específicos – de painéis fotovoltaicos e/ou eólicas – que são necessários para que tal seja possível).
Por fim, no final desses 24 meses, gostaríamos também de verificar a resiliência do sistema, seja em termos de fiabilidade do equipamento instalado, seja também em termos de robustez a eventuais tentativas de roubo ou atos de vandalismo.
Quais os próximos planos para o projeto?
Uma vez terminado o período de 24 meses, se o projeto for avaliado positivamente (como esperamos que seja), esperamos começar por apresentá-lo a ONGs que trabalhem em Campos de Refugiados ou também a agências das Nações Unidas, disponibilizando os resultados e o know-how adquiridos graças a este projeto-piloto. E apresentá-lo também a outras instituições ou pessoas que possam ter interesse num sistema de produção de alimentos frescos e saudáveis que é amigo do ambiente, e que é autónomo, transportável, e escalável.
Que mensagem quer deixar o projeto à sociedade?
O nosso objetivo principal é o de promover o cuidado da pessoa humana e do meio ambiente: apoiar e ajudar seres humanos em situações precárias, sem com isso pôr em causa os equilíbrios e a biodiversidade do nosso planeta.
Estamos ainda num processo de escolha de frases que possam ser usadas para apresentar o sistema Super-Horta. Uma delas poderia ser: “Convertendo pequenos espaços em grandes possibilidades”; Ou então também: “Super-Horta: Um sistema vivo, móvel, regenerativo – porque a fome não pode esperar”.