#Economia Circular: “Vera Gallardo” centra-se numa perspetiva de compra “mais consciente e local” para respeitar “natureza” e “recursos”
A Economia Circular está, hoje, subjacente em muitas empresas. Produtos sustentáveis, amigos do ambiente e com um ciclo de vida longo são, cada vez mais, uma opção. Há também quem ponha em prática estes conceitos e desenvolva os seus próprios produtos. Com o objetivo de dar “voz” a projetos de cariz sustentável, a Ambiente Magazine irá, todas as semanas, apresentar algumas iniciativas aos nossos leitores e dar a conhecer o que se faz em Portugal nesta área. Esta semana, partilhamos o projeto “Vera Gallardo”.
O projeto Vera Gallardo (VG) foi fundado com a missão de “promover” e “acelerar” a “transição” para uma “sociedade mais sustentável”, para que esta gere o “menor impacto possível no planeta”, quer por via dos “comportamentos da população” quer por via das “atividades decorrentes das empresas”. Para tal, Vera Gallardo, fundadora da VG, explica que o projeto foi criado com base em “duas vertentes” de “negócio distintas” e em “sintonia” com a sua missão. Uma vertente que tem como público as “consumidoras femininas” e o “universo da moda e da beleza”, tendo sido criado o site www.veragallardo.com com a “intenção clara” deste ser um “acelerador para a adoção de comportamentos mais sustentáveis”, ajudando as “mulheres a fazerem o seu processo de transição”. Assim, através do site e dos artigos lá partilhados, como dos workshops, o objetivo é dar a “conhecer o universo da moda e da beleza sustentável” de uma forma “consciente e apelativa”, mas “sem gerar impactos negativos no planeta”, saindo do “consumo de moda ou beleza main stream”. Depois, a outra área de negócio centra-se na “consultoria às PME ́s” que são as “destinatárias preferenciais do serviço que prestamos”, explica. Este serviço pretende “ajudar as empresas mais pequenas a fazerem a transição” e a “modelar as suas áreas interdepartamentais a convergir com o contexto regulamentar, político e social”, que tem vindo a surgir e que continuará nos próximos anos, por via da “necessidade de aumentar a sustentabilidade nos negócios” e de “chegarmos aos objetivos a que nos vinculámos” no Acordo de Paris, afirma.
[blockquote style=”2″]O discurso não pode ser nem catastrofista, nem superficial[/blockquote]
Ambientalmente a VG centra-se numa perspetiva de compra mais consciente e local, em respeito pela “natureza” e pelos “recursos”, eliminando a “utilização de animais em produto ou em testes”, promovendo “maior igualdade e condições dignas de trabalho” e “preferir marcas sustentáveis às restantes”. E nestas matérias, a fundadora do projeto quis chamar a atenção para o facto da Indústria da Moda ser a “segunda mais poluente” para o planeta: “Facilmente conseguimos perceber o quanto este facto está associado aos nossos comportamentos, quero dizer que mudando apenas os nossos comportamentos, estaremos a contribuir para o desacelerar dos danos”. Assim, ao conseguirem “incentivar a adoção destas premissas” Vera Gallardo não tem dúvidas de que serão capazes de “contribuir muito positivamente” para a “recuperação ambiental” do planeta. E claro “sem obviar as responsabilidades da própria indústria”, acrescenta, ressaltando, contudo que “sem a exigência dos próprios consumidores”, a “maioria e sobretudo as marcas gigantes nada farão”. Através da “consciencialização das consumidoras”, a responsável acredita que é possível fazer a “transição desejável”, mas o “discurso não pode ser nem catastrofista, nem superficial”, sendo preciso” encontrar o tom certo para o diálogo” que é estabelecido entre a marca VG e os seus utilizadores: “É um exercício que é desafiante, mas que dá imensa satisfação”. A marca desde o seu registo que tem “definida” a sua política de sustentabilidade: “Os parceiros e fornecedores devem apresentar somente soluções sustentáveis e apenas estas podem ser adquiridas”, declara
[blockquote style=”2″]Projeto sustentável economicamente de forma autónoma[/blockquote]
Neste momento, o site www.veragallardo.com conta com quatro meses de existência, estando a fazer um percurso muito interessante: “Já foi visitado por internautas de 50 nacionalidades diferentes, mas é em Portugal e no Brasil que se encontra a sua maior base de utilizadores, embora esta continue a expandir-se”. No que diz respeito aos serviços, Vera Gallardo refere que estão ainda numa “fase de lançamento” e o mesmo acontece com a “captação de clientes”. Ainda assim são “imensas” as oportunidades: “Como sabemos a sustentabilidade, em qualquer setor, encontra-se no epicentro estratégico, as alterações regulamentares, podem levar alguns negócios a tornarem-se obsoletos, e os empresários precisam estar preparados para fazer a transição atempadamente”. Futuramente, o projeto poderá estender a atividade a outras áreas, mas, neste momento, e tendo em conta a fase em que se encontra, o “mais importante” e o “grande foco” de toda a equipa é que (o projeto) “ganhe dimensão” e seja “sustentável economicamente” de “forma autónoma”, sustenta.
Questionada sobre as potencialidades de Portugal no que à moda sustentável diz respeito, Vera Gallardo não tem dúvidas de que o país tem “todas as condições” para ser um “player competitivo” e, ao mesmo tempo, “oferecer soluções sustentáveis”, estando a fazê-lo no “calçado”, nos “acessórios” e no “vestuário”. Depois, há também o fator “diferenciação” uma vez que Portugal tem “tradicionalmente know-how” nestes setores, refere. Contudo, a responsável nota que há uma necessidade de “acrescentar mais competência a vários níveis” e em “toda a cadeia de fornecimento”, constatando que o modelo de produção e as univerisades portuguesas têm um papel preponderante em matérias de inovação, design, tecnologia e no desenvolvimento de materiais ecológicos: “É todo um circuito que se deve olear para acompanhar a grande mudança que se estima que se fará nos próximos anos”. Assim, a fundadora do projeto defende a necessidade de se “investir”, destacando que “os programas de apoio ao investimento para estas empresas será um dos fatores determinantes”, mas não é exclusivo: “Os líderes políticos têm um papel crítico, seja em Portugal ou em Bruxelas, porque não podemos esquecer que estamos dentro de uma comunidade, e que os líderes que se fazem representar desempenham um papel fundamental no desenho do futuro em relação a todas estas matérias”. Mas, também, por “via de um acordo histórico”, o “Acordo Climático de Paris”, que é um “farol do qual ninguém nem nenhum país deve tirar os olhos”, sustenta.
[blockquote style=”2″]Falta uma estratégia nacional para os resíduos da indústria da moda[/blockquote]
Já sobre o facto de Portugal estar ou não num bom caminho em matérias de economia circular, a responsável lembra que “incorporar” um “sistema” ou um “modelo de negócio” com princípios de Economia Circular é um “desafio” para “qualquer país”, quer para as “indústrias tradicionais”, quer para as “empresas”, e até para os “cidadãos”. Mas é possível fazê-lo? Vera Gallardo diz que sim e, em Portugal, faz-se através do PAEC (Plano de Ação para a Economia Circular) onde existem “objetivos claros” para que se faça a “transição” de uma “economia linear” para uma “economia circular” a nível nacional, regional e setorial. Além disso, a “eco-inovação” e a “desmaterialização” são duas das abordagens que estão em “vários planos para a gestão sustentável de recursos”, mas, ainda assim, destaca a responsável, “os resíduos da indústria da moda levantam vários desafios”, faltando uma “estratégia nacional” para a sua valorização: “Regular este setor de resíduos, ainda que sendo difícil, não pode ser esquecida”. Só Portugal “descarta 200 mil toneladas de têxteis por ano”, diz, acrescentando que, ainda assim, é o país que representa uma “fatia menor” quando comprado com muitos outros países: “É possível imaginar a dimensão do desastre ambiental se não se atuar de imediato”, alerta. No entanto, há quem se preocupa com estas matérias: “Existem algumas iniciativas, como marcas de moda que estão a reutilizar os excedentes das suas anteriores coleções e, também, empresas que trabalham para este setor, que reciclam os excedentes da indústria e vendem depois este sub-produto às várias marcas de moda sustentável, que desenham e produzem as suas coleções incorporando estes materiais”. Há ainda “muitos movimentos” de “designers, artistas e marcas” que estão a “transformar lixo e a valorizá-lo (trashion)”, refere, notando que existe “consciência de que é necessário fazer algo e extremo se necessário”. Mas, os países, na generalidade ainda estão na fase de “pensar e planear”, mais do que “regulamentar ou executar”, diz.
[blockquote style=”2″]Os líderes não podem apenas falar que é preciso fazer essa transição sem dar sinais[/blockquote]
Na opinião de Vera Gallardo as empresas ligadas à sustentabilidade merecem ter a “atenção” dos vários agentes económicos e políticos: “O próprio sistema financeiro deve olhar para este setor económico como o de maior potencial, aquele que deveria ter acesso a financiamento mais facilitado e com melhores condições”. E existem algumas empresas do sistema financeiro que “orientaram a sua política de financiamento para uma área promissora”, como são as “empresas tecnológicas e de inovação sustentável”, porque “vêm aí o futuro”, refere. Assim, segundo vários especialistas, “se for transferido o financiamento ao setor petrolífero para estas (empresas)”, haverá “reais condições” de transição para uma economia verde: “Os líderes não podem apenas falar que é preciso fazer essa transição sem dar sinais de que vale a pena os empresários arriscarem, até mesmo para as empresas que ainda estão no modelo “business as usual” e que podem antever vantagens na transição, mas que receiam tornarem-se altamente vulneráveis à sua própria sustentabilidade”.
Tendo em conto o contexto atual, Vera Gallardo refere que a pandemia pode ter “consequências” que se farão sentir a médio-prazo, defendendo que será mais “sensato” planear com “este cenário em mente”. O setor da moda e da beleza são um dos exemplos que estão a debater-se com “algumas dificuldades”, mas como em “qualquer situação difícil” há sempre “quem consiga diferenciar-se” e “encontrar os caminhos da prosperidade e do sucesso”, diz. Já outros (setores) até já estavam preparados para situações inesperadas como esta: “Vemos marcas que conseguem apresentar bons resultados contra previsões negativas”. Na perspetiva do consumo, a responsável refere que “os extremos tendem a ser os mais sentidos”, mas pelo que “tem sido reportado” os “efeitos estão a fazer-se sentir transversalmente neste setor”, até porque a “moda (à exceção da infantil) é quase sempre suprível”. Já no caso do projeto VG com o contexto atual, Vera Gallardo afirma que será necessário ir “ajustando os objetivos”, e as “próprias estratégias”. A pandemia veio “limitar a ação” que estava “planeada” para esta fase de lançamento: “Há alguns investimentos que se mantém porque é necessário dar o máximo para obter o possível. E é natural que possam ainda existir ajustes e novidades, nomeadamente, que alguns serviços possam integrar as plataformas digitais”, refere.
Qual o cenário para daqui a 10 anos?
O caminho para a sustentabilidade neste setor tem vindo a ampliar-se até por via das campanhas negativas de que muitas das “high brands” foram alvo. As redes sociais facilitam a disseminação de informação, e as marcas veem-se obrigadas a ter em consideração um público mais amplo, mais consciente e mais informado. Seja porque a notoriedade da marca é afetada, porque decresce a confiança do seu consumidor ou dos acionistas ou porque leva à quebra das vendas, é inevitável que as marcas estejam sincronizadas com a procura e a expetativa do seu cliente. A literacia em sustentabilidade está a aumentar, e os termos “greenwashing” passam a ser dominados pelo consumidor comum, já não basta parecer sustentável vai ser mesmo preciso sê-lo. Nos próximos anos, os movimentos pela igualdade, pela proteção ambiental, pela dignidade laboral, pelos direitos à diversidade étnica e de género, ganharão ainda mais visibilidade e constituíram um desafio social, ao qual será difícil ficar apartidário, mesmo para as marcas de Moda ou de Beleza. Muitos dos jovens que têm uma posição muito lúcida sobre as consequências dos comportamentos humanos nos últimos 30 anos, terão um papel mais ativo e farão a pressão para que os seus interesses e direitos sejam escutados pelos vários agentes sociais, políticos e financeiros. Por todas estas razões, parece-me que vamos transformar-nos enquanto sociedade, que durante muito tempo foi conhecida pela “sociedade do ter” para passarmos a uma “sociedade do ser”. E para a sustentabilidade do nosso planeta, estes são sinais promissores.
[blockquote style=”3″] Se quer ver o seu projeto na Ambiente Magazine, envie-nos uma breve apresentação para: ambientemagazine@gmail.com [/blockquote]