#Economia Circular: “100etiqueta” quer dar à roupa o verdadeiro significado da economia circular
A Economia Circular está, hoje, subjacente em muitas empresas. Produtos sustentáveis, amigos do ambiente e com um ciclo de vida longo são, cada vez mais, uma opção. Há também quem ponha em prática estes conceitos e desenvolva os seus próprios produtos. Com o objetivo de dar “voz” a projetos de cariz sustentável, a Ambiente Magazine irá, todas as semanas, apresentar algumas iniciativas aos nossos leitores e dar a conhecer o que se faz em Portugal nesta área. Esta semana, partilhamos o projeto “100etiqueta”.
Janete Silva, Daniela Catalão e Diana Santos são as responsáveis pelo projeto “100etiqueta”: “É a primeira plataforma de subscrição para pais e bebés em Portugal que tem como core business a economia circular”. A ideia deste projeto surge do facto de que, na generalidade, “a oferta de roupa de que os bebés dispõem é muito superior àquela de que necessitam”. A 100etiqueta desafia, assim, os pais a terem apenas as roupas de que necessitam no momento em que necessitam. Para tal, são “disponibilizados kits” para que os pais possam usar nas idades adequadas, “devolver quando já não servirem”, recebendo um “novo tamanho adequado”. Este é o “verdadeiro significado de economia circular” e de “aproveitamento de roupa” num período da vida dos bebés em que a “maioria das compras é feita por impulso”.
E como é que funciona? As fundadoras da plataforma referem que obtêm a roupa através de “campanhas de recolha” direcionadas a “pessoas que querem esvaziar algumas gavetas” e, em troca, “é-lhes dado um voucher de 10 euros por cada quilo de roupa” que aproveitam para a construção dos kits. Para facilitar a entrega, a “100etiqueta“ dispõe de uma “rede de parceiras, de norte a sul do país”, essencialmente, em estabelecimentos que permitam “dar maior comodidade às pessoas” e também “reduzir a pegada ambiental de centenas de movimentações de roupa usada”.
Ambientalmente, a “100etiqueta” tem como objetivo “reduzir a pegada”, tendo a vantagem de “poder vestir os recém-nascidos das famílias” sem que se coloque mais roupa no mundo, criando um “sistema de reutilização” que permite também “poupar tempo” aos pais em “pesquisas e compras desnecessárias”, destacam.
[blockquote style=”2″]É urgente mudar a mentalidade do descarte nas ações do dia-a-dia[/blockquote]
Relativamente à temática da economia circular, as responsáveis destacam que os dados sobre Portugal são animadores: “Em 2019, um relatório da ONU realizado por cientistas independentes colocava Portugal em 26.º lugar, num total de 162 países, no que toca ao índice de desenvolvimento sustentável”. E esse número deve-se, em muito, ao “foco” que o país tem tido em “produzir energias renováveis”, declaram. Mesmo assim, são “identificados, de raiz, problemas em Portugal” como, por exemplo, “lidar com a qualidade da saúde, o trabalho digno, o crescimento económico e a aposta nas cidades e comunidades sustentáveis”. Segundo o relatório, Portugal continua com “desafios presentes na erradicação da fome e na produção, consumo sustentável, ação climática e proteção da vida marinha”. As fundadoras da “100etiqueta“ consideram que que existe ainda um potencial enorme dentro do país para crescer sustentavelmente e transformar a forma como se consume: “Fazemos parte de uma cultura com uma mentalidade mais convencional quando se fala de economia partilhada, desde roupa de segunda mão à partilha de bens essenciais”. Essa mentalidade é algo que foi ultrapassado em vários sítios da Europa, que encaram com “facilidade a troca e venda de roupas em segunda mão”. Ainda segundo o relatório da ONU de 2019, Portugal tem muitas dificuldades em “erradicar a fome” e “manter um crescimento económico constante”, o que pode “atrasar também a forma como as modificações no sentido da sustentabilidade ocorrem”, uma vez que “acentuam a desigualdade de classes sociais. A economia irá servir apenas uma minoria e o desenvolvimento urbano sustentável vê aí o seu grande entrave para entrar em cena”, referem as responsáveis. Em larga escala, as responsáveis consideram que tal realidade é “observável” no hemisfério sul, onde se “localizam as maiores florestas responsáveis pela absorção do dióxido de carbono” e que têm a “chave para a sobrevivência do planeta” mas que são “constantemente ameaçadas por monopólios de riqueza e de corrupção” que põe em causa o “desenvolvimento sustentável”.
Apesar das “obrigatoriedades do cumprimento” do Acordo de Paris, que veio “influenciar positivamente a forma como produzimos e exportamos em Portugal”, os dados do Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável indicam que a “produtividade dos recursos” e a “quantidade de resíduos” produzidos por euro de PIB gerado tem vindo a “diminuir”. Mas, ainda assim, Portugal está abaixo do nível médio europeu: “Há bastante espaço para evoluir em eficiência e em circularidade”, constatam. É assim, “obrigação de todos os cidadãos fazerem a pressão adequada” para que as “formas de produção” sejam “alteradas na totalidade” e todos devem fazer parte da mudança. E o mesmo serve para que os governos que devem “dotar o tecido empresarial de conhecimento” e “obrigatoriedade de transformação dos seus processos”.
Sobre possíveis desafios associados à Covid-19, as responsáveis acreditam que a pandemia veio chamar a atenção para a pegada que a sociedade deixa no mundo com toda a atividade que se produz: “Aconteceram coisas inacreditáveis como habitantes da Índia conseguirem ver pela primeira vez os Himalaias”, dizem. Houve, sem dúvida, um “tempo de reflexão” sobre aquilo que é consumido, mas também há o perigo de ter sido algo passageiro: “Mensalmente, o mundo usa129 biliões de máscaras descartáveis (BBC) e pouco falamos sobre o que acontece a essas máscaras”. A verdade é que os “materiais descartáveis vão ter sempre um papel determinante” como, por exemplo, na “área da saúde”. Ainda assim, é urgente “mudar a mentalidade do descarte nas ações do dia-a-dia”, as quais não comprometam a saúde pública, atentam. A questão vai para além da Covid-19 e prende-se com a necessidade de mudança de paradigma: “Muitos dos produtos descartáveis (desde as máscaras às luvas, passando pelos produtos de limpeza) têm equivalentes igualmente eficazes, contudo a informação ainda não é suficientemente espalhada e acessível para que seja consumida por todos”. Por outro lado, e como é característico em tempos de crise, o “espírito de comunidade e entre ajuda também se destacou”, aumentando o “sentido de responsabilidade e empatia para com o comércio local” e a “necessidade de levar um estilo de vida menos desenfreado. Nesta perspetiva, “os negócios que se apresentam como alternativa a um mundo desconectado do propósito comum”, que permitem uma “compra fácil e com entrega ao domicílio” e que “enaltecem valores mais conscientes” acabaram, igualmente, por “ganhar espaço no mercado”, referem.
Quais as perspetivas para o futuro?
Num cenário ideal, e desafiando algumas limitações atuais, em dez anos: as políticas sociais e ambientais ocuparão uma fatia maior nos orçamentos de estado de cada país; o acesso à habitação digna, à saúde, cultura e à educação serão oportunidades garantidas a toda a população; a energia renovável corresponderá a 95% do consumo energético na Europa; as grandes superfícies comerciais terão ao dispor produtos a granel e um sistema de embalagens reutilizáveis em curso (sendo que as grandes marcas e fornecedores irão apostar em soluções de embalamento e transporte mais sustentáveis); a alimentação de base vegetal será a dieta praticada por 50% da população; haverá um aumento e maior aposta na agricultura local e as hortas urbanas serão comuns nas cidades assim como o transporte coletivo e eficiente e a compra em segunda mão fará parte da realidade do consumo de 70% da população.
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