Descargas de efluentes nos rios e falhas no tratamento de esgotos preocupam ambientalistas e autoridades locais de todo o país, mas há também casos sem problemas significativos de poluição, com a qualidade da água “atestada” até por lontras.
Há muito que a contaminação do rio Lis, distrito de Leiria, devido a descargas das suiniculturas gera polémica. “Todos os dias temos de viver com o cheiro nauseabundo e abundância de moscas e insetos”, refere à Lusa o porta-voz da Comissão de Ambiente e Defesa da Ribeira dos Milagres, Rui Crespo, lamentando a contaminação de solos e lençóis freáticos.
A solução, aponta, passa “obrigatoriamente pelo tratamento de resíduos recebidos na totalidade” e pela “fiscalização apertada”, com sanções pesadas: “Há suinicultores que preferem pagar multas do que fazer tratamento, porque pagar 500 euros compensa”.
O presidente do município de Leiria considera que o Estado, “através da Águas de Portugal, por exemplo, deve contribuir financeiramente na resolução definitiva do processo de construção da estação de tratamento de efluentes suinícolas, de forma a ultrapassar o impasse existente ao nível do financiamento”.
“Só assim poderemos preservar o ambiente e, ao mesmo tempo, um setor que é muito importante para o tecido económico”, afirma Raul Castro.
O “mau funcionamento” de estações de tratamento de águas residuais (ETAR) que drenam para a bacia do Sado e a inexistência de tratamento de esgotos em alguns locais são as principais preocupações da Quercus sobre este curso de água, que nasce em Ourique (Beja) e desagua em Setúbal.
O coordenador da associação ambientalista em Setúbal, Paulo do Carmo, diz que são enviados alguns resíduos industriais sem tratamento para a ETAR de Ermidas, em Santiago do Cacém, que “não tem um sistema de tratamento eficaz para aquele tipo de águas”.
As situações são do conhecimento do diretor da Administração Regional Hidrográfica (ARH) do Alentejo, que admite “problemas” em “alguns aglomerados populacionais” ainda sem ETAR ou com uma muito antiga, referindo que estão “sinalizados” e em resolução.
Há ainda “ligações clandestinas aos emissários de esgotos” em algumas zonas industriais e outro ponto de poluição a que a ARH está atenta, prevendo mais fiscalizações, é a Marateca (Palmela), devido ao “espalhamento de lamas” de efluentes de origem pecuária.
André Matoso destaca, porém, que “as sedes de concelho têm todas ETAR a funcionar” e que a “população servida deficientemente por tratamento de esgotos não é muito expressiva”.
Bons exemplos
Nas bacias do Sado e do Mira – sem grandes aglomerados urbanos ou industriais -, embora haja problemas, não há “grandes descargas para os meios hídricos”, diz. Mira é, aliás, uma “das bacias hidrográficas mais bem cuidadas do país do ponto de vista da qualidade”.
O facto de o abastecimento de água para três milhões de pessoas da Grande Lisboa ser feito a partir da barragem de Castelo de Bode, nos limites dos concelhos de Tomar e Abrantes (distrito de Santarém), beneficia a “saúde” do Zêzere.
No seu curso (cerca de 200 quilómetros) há três barragens para aproveitamento hidroelétrico – Bouçã, Cabril e Castelo de Bode -, sendo desta que a Empresa Portuguesa das Águas Livres (EPAL) retira 80% da água para abastecimento, beneficiando dos grandes desníveis e do caudal de água, por vezes superior a 10.000 metros cúbicos/segundo.
O presidente da Câmara de Vila Nova da Barquinha, Fernando Freire, diz que o “cuidado intensivo” com a água faz deste “um rio sem grandes problemas ecológicos”. No concelho, o rio sofre, “sem grande intensidade”, os efeitos dos episódios de poluição no Nabão (um dos principais afluentes do Zêzere), que levaram recentemente os municípios de Tomar e Ourém a reunirem-se com a Agência Portuguesa do Ambiente para serem identificadas as fontes poluidoras.
O presidente da Câmara de Ferreira do Zêzere afirma que, por ser preservada para abastecimento humano, a qualidade da água do Zêzere não é uma preocupação. Jacinto Lopes aponta, porém, a premência da revisão do Plano de Ordenamento de 2003, que se deveria ter iniciado em 2013, considerando que este instrumento “castra o uso e fruição” do rio, ao limitar as atividades lúdicas e desportivas, o que contribui para a redução do turismo e de segundas habitações.
No rio Águeda, que nasce no Caramulo e se encontra com o Vouga em Aveiro, só pode haver poluição por acidente, segundo o presidente da Câmara de Águeda: “Aqui no centro da cidade de Águeda há registo de observação de lontras, o que, para quem conhece a espécie, é quase um certificado de alta qualidade da água”.
A melhoria da qualidade da água e da biodiversidade é evidente, mas nem sempre foi assim: em pequeno, Jorge Almeida fazia quilómetros de bicicleta para tomar banho no rio, que até Aveiro corria “todo negro”.
“Havia na zona de Assequins umas empresas de ferragens que faziam às vezes umas descargas na ribeira do Amial, mas essas empresas já fecharam e o problema ficou resolvido. Os problemas que temos tido são claramente acidentes”, diz, indicando um entupimento de um emissário no sistema multimunicipal de águas residuais e o rebentamento de uma conduta, ambos resolvidos.
“Temos um foco de poluição preocupante, isso sim, no rio Cértima”, afirma, explicando que no verão a maior parte do caudal era efluente por tratar, proveniente de ETAR obsoletas.
Em Viana do Castelo, a Capitania de Caminha aponta “focos pontuais de poluição” no rio Minho (340 quilómetros) e defende “intervenções que mitiguem as consequências no ecossistema”. O capitão do porto, Pedro Costa, lamenta também o lixo acumulado nas margens do rio internacional, que nasce na Galiza e desagua a norte de Caminha, devido aos incêndios.
O rio, diz, é “fortemente afetado” pela barragem espanhola da Frieira e foram criadas medidas para minimizar o impacto negativo: “Está obrigada a manter um caudal ecológico de modo a minimizar o impacte no ecossistema. No entanto, todas as espécies piscícolas migradoras e que supostamente deveriam subir o rio ficam impedidas de o fazer devido a esse obstáculo”.