Nos últimos dois anos, muito se tem ouvido falar no termo dessalinização, um conceito inovador com grandes contributos para o setor da água. Contudo, este é um termo que já existe há muito tempo, “já desde o tempo que o Homem começou a navegar longe da costa”. Foi com esta “provocação” que Nuno Pereira, Diretor de Produção da Águas e Resíduos da Madeira, S.A, iniciou a sessão plenária “Monitorização e Inovação”, realizada no âmbito do 16.º Congresso da Água, promovido pela APRH – Associação Portuguesa de Recursos Hídricos.
O gestor frisou que o assunto não é inovador, particularmente em Portugal, visto que o país tem uma longa história de 42 anos: “Até temos alguns pioneirismos na tecnologia”, afirma o responsável, aproveitando para fazer uma resenha mundial. Segundo Nuno Pereira, existem 8 mil dessalinizadoras com uma capacidade de 90 milhões de metros cúbicos por dia. Cerca de 45% estão situadas no Médio Oriente, no Norte de África, onde se verifica uma maior escassez de água, sendo que a capacidade instalada sobe entre 7 e 9% por ano, registando-se investimentos contínuos em vários países na ordem dos 10 mil milhões de dólares a cada cinco anos, perspetivando-se que duplique nos próximos anos. Mais de 300 milhões de pessoas dependem total ou parcialmente de dessanlinizadoras, e vários países, como Marrocos e Argélia, estão a apostar fortemente nesta tecnologia, sendo que estes dois países vão conseguir ultrapassar a capacidade de produção de água dessalinizada de Espanha, que é um dos países com maior capacidade a nível mundial: “Será num horizonte até 2030 que ultrapassarão a capacidade espanhola”, prevê.
Por seu turno, Portugal está numa situação bem mais favorável: “O nosso rácio entre a procura e existência de água é mais favorável do que estes países e, por isso, não tivemos a necessidade de recorrer tanto à dessalinização como agora”, explica o gestor, acrescentando que o país tem atualmente cinco centrais dessalinizadores de água do mar, com uma capacidade de 8 mil metros cúbicos diários, e uma dessalinizadora em projeto para o Algarve, com uma capacidade prevista de 65 mil metros cúbicos diários e com custo estimado de 65 milhões de euros.
O estado de amadurecimento elevado da tecnologia permite que uma dessalinizadora produza uma água fabricada de excelente qualidade: “Tudo depende do custo final do produto que estivermos dispostos a pagar”, diz, acrescentando que a origem da água é inesgotável, até porque “o mar tem 97% da água existente do planeta e, por isso, é uma tecnologia que é imune às secas”. Por outro lado, como desvantagens, Nuno Pereira aponta os custos elevados de investimento inicial e de operação ou os impactos ambientais que “têm de ser bem estudados”, visto que uma estrutura deste tipo tem um elevado consumo de energia, que pode ser colmatada “através da utilização intensiva de energias renováveis em elevada escala”, tal como noutra experiência na Áustria e em Espanha.
O caso de Porto Santo
Porto Santo é um dos cinco casos onde existe uma dessalinizadora. A ilha do arquipélago da Madeira sempre foi muito condicionada pela falta de água e, na década de 70 do século XX, para colmatar o problema, o Governo Regional decidiu avançar com a construção de uma central apostando numa tecnologia que, na altura, era muito inovadora: osmose inversa. “Foi a primeira central no território europeu a usar a osmose inversa e a quinta a nível mundial”, lembra Nuno Pereira, acrescentando que a capacidade instalada na altura era de cerca de 500 metros cúbicos por dia, tendo sido a primeira central a ter um sistema de recuperação de energia e fazer a captação de água em galerias subterrâneas, ou seja, “captando água subterrânea e não diretamente do mar”.
De gestão pública até 1999, na viragem do século foi concessionada pela IGA S.A, que já tinha a responsabilidade da produção da água em alta na Ilha da Madeira. A partir de 2002, iniciou-se um processo de remodelação que ainda continua, com uma capacidade de produção atual de 6500 mil metros cúbicos diários, sendo que, anualmente são produzidos 2,4 milhões de metros cúbicos, permitindo abastecer 35 mil habitantes.
O Congresso da Água é promovido bienalmente pela APRH – Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos. A 16.º edição decorreu, entre os dias 21 a 24 de março, no Centro de Congressos do LNEC.