O Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais – cE3c, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL), numa nota enviada à imprenssa, informa que já foi publicado um novo estudo científico, onde “alertam para falta de regulamentação na utilização de abelhões polinizadores nas estufas”
De acordo com a nota, este estudo “recomenda aos agricultores em Portugal um maior cuidado na eliminação das caixas de colmeias comerciais utilizadas para polinização em estufas agrícolas”. Esta recomendação surge após terem sido detetados na natureza abelhões que escaparam de colmeias comerciais – correspondentes a uma subespécie exótica em Portugal – e híbridos resultantes do cruzamento com a subespécie nativa do nosso país, o que “representa um risco para a conservação das espécies polinizadoras e para os ecossistemas”.
A introdução de uma espécie exótica num ecossistema pode ter um impacto profundo: não só esta espécie poderá tornar-se invasora e competir por recursos com as espécies nativas, como pode transmitir novas doenças e até cruzar-se com outras espécies próximas. As consequências de eventuais fenómenos de hibridação são imprevisíveis, podendo num extremo criar híbridos altamente adaptados que se tornam invasores, e noutro extremo criar híbridos menos adaptados, levando a um declínio populacional.
Nas estufas de culturas agrícolas, a libertação de insetos para o controlo de pragas ou a polinização de culturas é uma prática comum. Exemplo disso é o abelhão Bombusterrestris, que desde o final dos anos 1980 é criado e comercializado em larga escala por todo o mundo como um polinizador eficiente de várias culturas agrícolas, principalmente tomate. Existem várias subespécies deste abelhão, caracterizadas por possuírem adaptações locais que as diferenciam entre si. Em Portugal, os abelhões comercializados provêm de outras zonas da Europa e pertencem a subespécies diferentes (B. terrestristerrestris e B. terrestirs dalmatinus) da subespécie nativa do nosso país (B. terrestrislusitanicus).
No estudo agora publicado, os investigadores utilizaram milhares de marcadores genéticos para comparar os abelhões provenientes de colmeias comerciais com os abelhões nativos, em duas regiões do país: na zona Oeste, em que os abelhões comerciais são utilizados para polinização da cultura de tomateiro, e no Sudoeste Alentejano, em que são utilizados para a polinização de cultura de pequenos frutos. Não só detetaram na natureza vários abelhões que deveriam estar confinados às estufas, como detetaram também vários híbridos resultantes do cruzamento de abelhões comerciais com nativos.
“Numa altura em que se fala muito do declínio mundial dos polinizadores, não podemos esquecer que um dos fatores de risco é a introdução de espécies exóticas e em particular a utilização em larga escala de polinizadores comerciais vindos de outros locais. Nalguns países já existem leis que impedem a utilização de abelhões não nativos, mas em Portugal ainda não existe nenhuma regulamentação”, explica Sofia Seabra, primeira autora deste estudo e investigadora do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais – cE3c, na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.
De acordo com estes resultados, os investigadores fazem uma recomendação imediata aos agricultores: as caixas de colmeia que já não estão a ser utilizadas não devem ser deixadas do lado de fora das estufas, mas sim eliminadas de forma adequada, através de congelamento ou selagem numa caixa fechada. “Este deveria ser um procedimento habitual de modo a minimizar a fuga de abelhões, principalmente no final de vida da colmeia quando há produção de machos férteis”, reforça Sofia Seabra. Uma medida a longo prazo seria a produção comercial da subespécie ibérica Bombus terrestrislusitanicus, ainda mais porque há cada vez maior utilização de colmeias comerciais em culturas de ar livre onde é muito difícil evitar contactos com os abelhões nativos.
Este estudo resulta da colaboração entre investigadores do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (cE3c) na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, do Centro de Investigação em Agronomia, Alimentos, Ambiente e Paisagem (LEAF – LinkingLandscape, Environment, Agriculture and Food) no Instituto Superior de Agronomia da Universidade de Lisboa, e do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar da Universidade de Aveiro, com financiamento do Programa de Desenvolvimento Rural (ProDeR) e da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).