Cabo Verde candidata ilhas do Maio e Fogo a reservas mundiais da biosfera
Cabo Verde vai candidatar as ilhas do Maio e Fogo a reservas mundiais da biosfera da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), num processo coordenado pelo biólogo português António Abreu, noticia a Lusa. As candidaturas deverão dar entrada na UNESCO até 30 de setembro para poderem ser avaliadas ainda este ano e, em entrevista à agência Lusa, António Abreu, mostrou-se confiante na sua aprovação.
António Abreu, que há 10 anos fez, enquanto perito da UNESCO, a avaliação do potencial de uma candidatura cabo-verdiana à rede mundial de reservas da biosfera, está de regresso agora para ajudar a preparar os processos a submeter àquela agência das Nações Unidas. “Há pelo menos 15 anos que Cabo Verde está a mexer-se neste domínio, mas nunca submeteu uma candidatura. Houve intensões para vários sítios. Vim cá há dez anos fazer a avaliação do processo de potencial de candidaturas e a conclusão foi que podíamos fazer reservas da biosfera em quase todas as ilhas”, disse.
O processo de candidatura da ilha do Maio é o que está mais avançado, mas António Abreu assinala que há ainda muito trabalho a fazer. “Há dois anos Cabo Verde ia candidatar o Maio e o dossiê estava quase pronto, não conseguimos terminá-lo a tempo e depois houve uma dinâmica diferente e os trabalhos foram suspensos. Estão a ser retomados agora, não só para o Maio, mas também para o Fogo”, revelou.
Com mais de 25 anos de experiência nesta área, o biólogo português, que já preparou várias candidaturas de sucesso e esteve também do lado da avaliação, como especialista da própria UNESCO, não tem dúvidas que a criação das reservas da biosfera nas ilhas do Maio e Fogo será uma realidade. “As candidaturas vão ter sucesso. Não vamos propor nenhuma candidatura que não seja válida, sólida e competentemente elaborada. As candidaturas têm pernas para andar”, considerou.
Para António Abreu, Maio e Fogo têm valores naturais, patrimoniais e culturais únicos em torno dos quais será possível criar “uma marca” que permitirá diferenciar as duas ilhas e o país como destino turístico. “As reservas da Biosfera vão ser as ilhas integrais e o cordão de mar à volta pelo menos até três milhas. Vamos evidenciar a presença de uma biodiversidade muito importante, com muitos elementos endémicos únicos, mas também uma forte ligação entre a natureza e as pessoas, entre o modo de vida, a cultura, a maneira de estar e ser quer com as espécies, quer com os habitats, quer com as paisagens”, explicou.
O vulcão, o vinho e o café, bem como as aves Gongon, os lagartos e uma série de pequenas plantas são elementos a valorizar na ilha do Fogo, enquanto no Maio pontuam as tartarugas e a exploração do sal, cujo potencial é destacado por António Abreu. “O vulcão é um elemento natural muito importante, é uma atração de grande valor que poderá ajudar a diferenciar a ilha do Fogo. Tem um potencial fantástico, está perto da Europa, tem elementos que só existem no norte da Europa, mas que lá não estão disponíveis todo o ano, aqui estão”, disse.
“No Maio há um potencial tremendo, que é o sal, mas não pode ser o sal só, tem que ter associada uma história, uma boa imagem e uma boa comunicação e eventualmente uma parceria”, acrescentou. António Abreu alerta que as reservas de biosfera “não são reservas de passarinhos e plantinhas” e que a atribuição do galardão da UNESCO é apenas o início de um processo.
“A consagração é apenas o início. A partir daí as reservas vão entrar na rede mundial com mais de 600 reservas em 120 países”, disse António Abreu, assinalando que a participação nesta rede abre perspetivas de cooperação com outras reservas, de promoção da investigação e de procura de fundos internacionais.
“Estas reservas têm que cumprir a função de conservação, de desenvolvimento e apoio logístico. São sítios de investigação e vão promover investigação quer local, quer em parcerias internacionais. Criam autoestima, envolvimento e oportunidades, mas há também uma dimensão económica que não se deve descurar”, defende António Abreu.
O biólogo aponta como exemplo o caso do Reino Unido, onde o custo estimado de criação de uma reserva ronda os 180 mil e 200 mil euros, a sua manutenção entre 70 mil e 90 mil euros e o retorno atinge os 2,8 milhões de euros. “É um bom negócio e a natureza não está a estragar-se”, sustentou.
O biólogo, que está neste projeto no âmbito da cooperação portuguesa, explicou que Portugal tem uma comparticipação de 40 mil euros, enquanto Cabo Verde investiu 14 mil euros, além do envolvimento da equipa técnica que está a trabalhar na candidatura.
Quanto às expectativas de retorno, adiantou que nesta fase do processo não foi ainda feita a estimativa, que avalia diversas vertentes, nomeadamente o valor dos recursos endémicos, bem como os seus impactos nas vidas das populações, na promoção do turismo e na criação de empregos, entre outras. “Temos que fazer contas, temos que definir uma visão, um plano de investimentos e estratégias até par ir buscar fundos”, disse.
Em 2015, Cabo Verde tinha registadas 3.512 espécies de animais, plantas, fungos e líquenes, 20% das quais se encontram ameaçadas. Registava igualmente 176.133 hectares de áreas protegidas, 41% em terra e 59% no mar.