O administrador da EDP Comercial alertou para o aumento dos impostos e taxas no setor elétrico, representam hoje quase 40% da fatura da luz, que poderá vir a pesar no bolso dos portugueses. “Os custos podem agravar-se e ter impacto no cliente final – que é sempre quem paga”, falava António Coutinho, durante um encontro promovido pela Elecpor – Associação Portuguesa das Empresas do Setor Elétrico, em Lisboa.
Para o responsável, uma parte muito significativa dos custos que recaem no setor elétrico em Portugal – como os que dizem respeito às energias renováveis e cogeração, ao suporte social, ao apoio ao setor nuclear, à eficiência energética, à segurança de abastecimento, às taxas de concessão, à regulação e operação de mercado, outras taxas e impostos e ao IVA – “resultam de decisões políticas”.
António Coutinho considera que é dada pouca ênfase à subida de preços ao consumidor. Por sua vez, também a Comissão Europeia (CE) veio dizer que, entre 2008 e 2015, esse aumento atingiu os 72% devido a Tax&Levies.
Políticas implicam elevados custos em Portugal
Portugal, por seu turno, é um dos países que mais custos apresenta, nomeadamente devido aos gastos de produção (1440 milhões de euros, cerca de 32 euros por megawatt/hora), mas também por decisões políticas (1427 milhões de euros). Ou seja, isso resulta em mais impostos para o setor elétrico. Na ocasião, durante a conferência “Pacote Energia Limpa para os consumidores europeus”, António Coutinho deu conta de impactos económicos na ordem dos 100 milhões no setor através da tarifa social, um desconto de 33,8% face à tarifa normal concedida a 815 mil agregados familiares em Portugal.
Já a cobrança do imposto sobre os ativos das energéticas, uma contribuição extraordinária sobre o setor, irá rondar os 85 milhões de euros, de acordo com uma estimativa para a EDP e a Rede Eléctrica Nacional (REN).
Por sua vez, a proposta da ERSE – de pagamento de 4,75 euros por MWh -, deverá ter um impacto de 85 milhões de euros, reduzindo em nove Terawatt/ hora a produção das CCGT e, ao mesmo tempo, aumentar as tarifas de acesso à rede de gás. Também o imposto sobre produtos petrolíferos a aplicar no carvão irá rondar os 10 milhões de euros em 2018, sendo expectável que atinga um valor superior até 2022.
Segundo o administrador da EDP Comercial, este aumento de preços cobrados ao consumidor é também reflexo de uma estrutura desalinhada com os custos. Em consequência, António Coutinho defende que muitos clientes irão optar por instalar painéis solares, o que explica elevadas implicações: atraso na eletrificação e descarbonização, alocação ineficiente de investimento, regressão social no financiamento de políticas e aumento da pobreza energética.
Para António Coutinho o pricing inadequado da eletricidade é um dos pontos que dificulta a eletrificação da economia, fundamental para a descarbonização, e gera pobreza energética. No mesmo contexto, defende que algumas das soluções possam passar por repartir os custos das políticas de descabornização por outras fontes de energia, financiar os custos das políticas através do Orçamento de Estado, subir a componente de potência ou estipular um valor de ligação e definir opções tarifárias com diferentes pesos de preços de potência e energia.
Uma crítica aos pressupostos do programa europeu
Por sua vez, o presidente da EDP Renováveis, João Manso Neto, considera que o programa europeu [Pacote Energia Limpa] está “claramente abaixo daquilo que é exigível”, nomeadamente em quatro áreas: o desenho de mercado, a promoção das renováveis, o modelo de governação e a sustentabilidade do sistema e incentivos à eletrificação.
Segundo João Manso Neto, a CE continua a usar como referência um modelo “marginalista”, preso a uma ortodoxia de há 20 anos, que “não atrai investimento nenhum, nem rentabiliza tecnologia”. Igualmente pouco defensável é o impedimento das centrais a carvão existentes de atuarem no mercado. Por isso, sublinha, “no campo do market design [desenho de mercado], não só não existe progresso como inclusivamente há um retrocesso ao tornar ainda mais complicado aquilo que deveria ser estrutural”.
Para o responsável, o objetivo global de fomento de penetração das renováveis (27%) é aceitável e até admite que, embora algo tímidos, “com alguma facilidade cheguemos aos 30%” durante o diálogo com o Parlamento Europeu. Mas essas intenções não são suficientes.
João Manso Neto considera que a indústria não precisa de subsídios, mas de previsibilidade, referindo-se à necessidade dos contratos a longo prazo. Garante ainda que continua a existir uma “obsessão de exigir às velhas tecnologias o mesmo tipo de responsabilidades”, defendendo que cada um tem de ser responsável pelo que pode gerir. Por outro lado, o mesmo responsável frisa que “há um problema sério de Governo”. Isto porque, não havendo objetivos nacionais, “não está claro e não se criou um mecanismo sela de atuação, quando ou se existirem desequilíbrios”.
Referindo que o mesmo já foi observado na gestão dos preços de CO2, Manso Neto afirma que, muitas vezes, o Governo procura legislar sobre matérias de detalhe ao passo que questões de fundo – como os objetivos das renováveis – são deixadas ao acaso. E, continuando assim, isto significa que a política energética continuará a ser dirigida pela Direção Geral de Concorrência ao invès de o ser pela Direção Geral de Energia.
São também débeis os sinais para o fomento da eletrificação, designadamente por falta de métricas que promovam a eficiência energética nos transportes. Por outro lado, também ainda nada foi dito no sentido de libertar o preço da eletricidade de custos e impostos que, afirma Manso Neto, “nada têm a ver com o setor elétrico”, ou sobre a reformulação do sistema tarifário em ponto algum.
*Este artigo foi publicado na Ambiente Magazine 76.