O município de Angra do Heroísmo, nos Açores, decidiu não candidatar, este ano, a zona balnear da Prainha à bandeira azul, depois de, no ano passado, terem existido queixas sobre alegadas descargas de esgotos perto do local. “A Prainha tem todas as condições para ter bandeira azul, só que nós, dada a polémica que houve o ano passado, entendemos que não valia a pena e que era um bocadinho desprestigiante continuar com este debate”, adiantou, em declarações à Lusa, o presidente da Câmara Municipal de Angra do Heroísmo, Álamo Meneses.
No verão passado, a associação ambiental local Azulinvade alertou, por várias vezes, nas redes sociais e junto das entidades competentes, para a possibilidade de a qualidade da água da Prainha ter sido afetada por descargas de esgotos para o mar, alegando que se fazia sentir no local um cheiro intenso e que a água tinha manchas castanhas. A autarquia respondeu sempre com análises dentro dos parâmetros estabelecidos, exceto no dia 06 de setembro, em que água se apresentava “imprópria para banhos”.
Os valores de “enterococos intestinais” atingiram as 28.000 unidades de formação de colónias (UFC) por 100 mililitros, quando não deveriam ser superiores a 350, enquanto os valores da bactéria “escherichia coli” se encontravam nos 7.000 UFC/100ml, quando o limite aceitável era 1.200.
Álamo Meneses salientou, no entanto, que esta amostra foi recolhida “junto à saída da tubagem de escoamento das águas pluviais, num dia de muita precipitação” e que foi uma das sete análises adicionais realizadas por iniciativa da autarquia em 2018, por isso, não foi considerada pelas entidades oficiais para atestar a qualidade da água da Prainha, classificada nos últimos quatro anos como “excelente”.
O autarca admitiu que, em situações extremas, são necessárias descargas do esgoto para o mar, mas disse que isso acontece longe da Prainha e numa zona de mar profundo, não afetando a qualidade da água da zona balnear. “As descargas de uma mistura de água da chuva com esgotos aconteciam e vão continuar a acontecer em situações extremas, quando há chuva muito intensa, porque a nossa rede da cidade não é totalmente separativa. Isso quer dizer que há muita gente que tem pátios e beirais ligados à rede de esgotos e isso cria um pique de caudal que a estação elevatória não tem capacidade de gerir, por isso, quando há chuvas muito intensas acontece isto”, avançou.
Segundo o autarca, as descargas de emergência ocorrem desde que existe rede de esgotos na cidade, mas este ano vão “diminuir muito”, tendo em conta que foi criada uma nova estação elevatória noutra zona da cidade, para onde já foi encaminhada uma parte dos esgotos.
Apesar de não ter bandeira azul, a Prainha vai continuar a ser vigiada por um nadador-salvador e a integrar o plano de análises do município, mas o presidente da associação Azulinvade, João Medeiros, defende a sua interdição ao público. “O esgoto continua a correr para o mar sem tratamento absolutamente nenhum, como tal, a Prainha vai voltar a ser poluída”, frisou, alegando que “é um atentado à saúde pública”.
O ambientalista alega que, se as descargas de esgotos, feitas a cerca de um quilómetro da zona balnear, ocorrerem num dia em que o vento esteja de quadrante sul e a maré enchente, acabam por ser arrastadas até à Prainha. Em 2018, João Medeiros contou, pelo menos, cinco descargas e afirma que só não foram detetadas pelas análises porque não foram realizadas nos dias em que elas ocorreram. “Permitir que pessoas tomem banho numa água completamente contaminada é um crime. No dia em que foram feitas as análises, com valores enormíssimos em relação ao normal, as pessoas tomaram banho, porque o resultado da análise veio um dia ou dois depois”, salientou.
Segundo o presidente da Azulinvade, as descargas ocorrem sempre que falta a luz, se verificam avarias na estação elevatória ou chove em grande quantidade, mas a autarquia não interdita a praia, nem mesmo nessas ocasiões. “Tinha de se arrear a bandeira azul e hastear a bandeira vermelha e isto nunca foi feito”, apontou.
A associação ambiental apresentou uma queixa-crime ao Ministério Público no ano passado contra o município de Angra do Heroísmo e a Associação Bandeira Azul da Europa, que, segundo João Medeiros, ainda não teve desfecho. “Já fui ouvido. O processo está em aberto. Continua-se a averiguar a queixa e ainda não tivemos resultados”, avançou.
A Prainha de Angra do Heroísmo foi galardoada com a bandeira azul 19 vezes nos 32 anos de programa, incluindo os últimos cinco anos, segundo a Associação Bandeira Azul da Europa, que confirmou que o município não a candidatou este ano.