#Ambiguia: A falta de água será a próxima crise europeia?
Depois de um mês de abril com recordes de temperatura máxima, o Governo já declarou situação de seca em 40% do território nacional. A esta situação acresce que Portugal está entre os países que mais vai sofrer com a falta de água. Já são muitos os investigadores a alertar para a necessidade e urgência de um consumo mais sustentável.
No meio de tantos alertas, será que a falta de água pode vir a ser a próxima crise europeia?
Por: Rui Godinho, Presidente do Conselho Diretivo da APDA (Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas)
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O que é que significa estar 40% do território nacional em seca?
Revela que se estão a concretizar as previsões e os alertas, pelo menos desde 2017, sobre a ocorrências de secas severas, mais frequentes e mais prolongadas, com a consequente escassez de água, particularmente em Portugal e na Península Ibérica, comprovando este indicador a evidência científica que as suportavam.
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Como é que se explica uma situação de seca em 40% do território nacional no mês de maio
Significa nomeadamente que a intensidade e gravidade dos efeitos das alterações climáticas se vêm agravando, criando já uma situação de “emergência” em todo o Planeta e também na Península Ibérica, o que impõe que seja enfrentada como uma das mais sérias “mudanças globais” que nos afetam. As suas implicações sobre as disponibilidades de água e a necessidade de medidas estruturais não têm sido suficientemente consideradas, tardando a mobilização de políticas públicas, capacidades e meios financeiros adequados à crescente dimensão negativa dos seus efeitos.
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Como se prepara um País como Portugal para responder a um desafio desta envergadura?
Desde logo, tomando consciência da urgência da decisão de colocar a “gestão da água”, em toda a sua dimensão e complexidade, no topo da “agenda política” nacional e contribuir para que o mesmo suceda a nível internacional, tanto europeu como mundial.
Além disso, assumir sem hesitação que a água deverá ser considerada um recurso estratégico, como a APDA tem vindo a propor ao setor e aos responsáveis políticos nacionais, para a construção da segurança hídrica nacional, através da criação de “reservas estratégicas de recursos hídricos superficiais e subterrâneos”, associadas à aplicação de princípios e práticas de boa governança, bem como às disponibilidades e aos serviços de água e de saneamento, e promovendo o seu uso eficiente em todos os setores consumidores, devendo estes princípios constituir um pilar fundamental das políticas públicas ambientais e de ação climática no contexto de reforço da segurança e soberania nacionais.
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Quando é que o cidadão vai dar o verdadeiro valor à água? E até lá o que se pode fazer?
A criação e consolidação do envolvimento dos cidadãos para fomentar uma sólida consciência de que a água é seguramente o “recurso mais precioso” com que lidamos são tarefas de toda a sociedade, não só no que toca aos comportamentos do quotidiano, mas também à assunção do valor da água como um dos indiscutíveis valores éticos das sociedades do nosso tempo. É afinal da garantia da subsistência da “vida”, como a conhecemos.
É preciso um “Novo Contrato Social e Político” para estabelecer a harmonia nas relações entre a Humanidade e também nas nossas relações com o Planeta, porque, infelizmente, consideramos/tomamos a natureza (e a água!!!), e os seus ciclos, como garantidos e um adquirido sem limites e sem fim (Maria Fernanda Espinosa, Ex-Ministra do Governo do Equador e Ex-Embaixadora das Nações para o Meio Ambiente – Expresso, setembro de 2020).
Quanto ao “Valor da Água”, a APDA tem concluído um projeto de “Campanha Nacional”, que apresentará em breve às autoridades com vista a garantir o adequado apoio ao seu lançamento e concretização. Abrangerá todos os setores e “stakeholders” relevantes, com vista a construir uma real consciência coletiva do que está em causa.
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A agricultura e o turismo são mesmo os setores que consomem mais água em Portugal, ou trata-se de uma “acusação” sem fundamento?
Sim. Todos os indicadores oficiais o confirmam.
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Como tornar estes setores mais despertos para o problema?
RG – Se falarmos de “perdas” e “uso não eficiente” da água, todos os setores deverão fazer melhor do que até aqui. Consulte-se o PNUEA – Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água – e o seu Plano de Implementação e constataremos que muito há a fazer para que, em Portugal, se atinjam os objetivos que aí constam e que é uma responsabilidade de todos os setores assumirem.
Destaca-se que nesse Programa foram fixados objetivos para a redução das perdas, para os três principais grandes consumidores, até 2020: Urbano – 20%, Agrícola – 35%, Indústria – 15%. Estamos muito longe de os alcançar e, quanto ao PNUEA, parece ter caído no esquecimento.
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A água pode vir a ser mesmo a próxima grande crise europeia?
A escassez de água já está assumida como uma grande crise que afeta toda a Europa, com particular incidência no Sul e toda a Bacia do Mediterrâneo em países como Portugal, Espanha (toda a Península Ibérica), França, Itália, Grécia, concluindo-se que esta grave situação assume já um carácter sistémico (veio para ficar!).
De acordo com o Special Report on Drought 2021 – COP 26, Glasgow November 2021, cenários de aumentos de temperatura média de 1,5 ºC, 2 ºC, 3 ºC, provocarão na União Europeia e no Reino Unido situações de seca com perdas económicas a subirem para mais de 65 mil milhões €/ano (hoje 9 mil milhões €/ano).