Cinco Organizações Não-Governamentais (ONG) de Ambiente — ANP/WWF, FAPAS, GEOTA, LPN, SPEA — pedem empenho e investimento na Conservação da Natureza e no Ordenamento do Território ao próximo Governo, lançando seis desafios.
Um país como Portugal, rico em biodiversidade, em que a natureza é um fator diferenciador para a economia local e para a imagem do território, não pode deixar de investir na proteção da Natureza. O próximo Governo tem que colocar a proteção das espécies e habitats à frente dos interesses económicos imediatos, das empresas petrolíferas e mineiras, das decisões fáceis, do turismo de massas e da agricultura intensiva.
Olhando para o panorama atual, com habitats e espécies em declínio, com dois processos contenciosos abertos pela Comissão Europeia e uma condenação recente do Tribunal Europeu de Justiça, as organizações signatárias deste comunicado não podem deixar de avaliar negativamente a ação do atual Governo ao longo dos últimos quatro anos. Para reverter esta situação, lançam 6 desafios que deverão ser prioridade no programa do próximo governo:
1. Proteger os Recursos Marinhos portugueses
O futuro executivo tem de definir de uma vez por todas as áreas da Rede Natura 2000 no Mar e avançar efetivamente com os respetivos planos de gestão. Tem de zelar ativamente pela proteção dos sítios, ao invés de os deixar à mercê de interesses económicos como os mega-projetos portuários, a exploração petrolífera e outros interesses económicos similares. Tem de mudar o paradigma da gestão dos recursos pesqueiros, numa abordagem precaucionaria, baseada no conhecimento científico, que defenda a sustentabilidade das populações marinhas.
2. Reduzir o impacto dos plásticos
A má gestão dos plásticos criou um problema de poluição que requer ação urgente e efetiva. É essencial que na próxima legislatura se definam métricas para determinar o impacto dos materiais de plástico, se desenvolvam alternativas, e se valorize o ciclo dos plásticos. Estas medidas devem acompanhar um maior investimento na investigação e mitigação de lacunas de informação referentes a este tipo de poluição.
3. Melhorar a legislação de conservação da natureza
A estabilidade e transparência são fundamentais na implementação das leis e regulamentos, e isso não foi tido em conta nos últimos quatro anos. É necessário encerrar rapidamente o processo de inclusão dos planos especiais de ordenamento nos Planos Diretores Municipais, ou então anular a legislação de 2016 que motivou um vazio legal. Todas as áreas classificadas, terrestres e marinhas, devem ter um plano de gestão. A cogestão tem de ser melhor explicada e implementada por fases e numa lógica mais adaptada a cada realidade. Nem todas as áreas protegidas têm condições para a gestão partilhada, por isso é importante que seja discutida a implementação da cogestão.
4. Investir mais na proteção espécies e habitats
Terá de haver investimento público suficiente na proteção da natureza e da biodiversidade no Orçamento de Estado, no Fundo Ambiental, e no Plano de Desenvolvimento Rural (PDR). Portugal tem 20% do seu território classificado como Rede Natura 2000. Por isso, é inadmissível que apenas 2% dos mais de 400 milhões de euros do Fundo Ambiental seja investido na conservação da natureza. Também o PDR (3 500 milhões de euros da Política Agrícola Comum), não tem investido o suficiente em medidas agroambientais para os agricultores dentro de áreas da Rede Natura 2000. O presente PDR deve ser reprogramado para investir pelo menos 100 milhões de euros em medidas de gestão agrícola da Rede Natura 2000 nos próximos três anos.
5. Apoiar a agricultura extensiva e a floresta nativa
A agricultura extensiva e floresta nativa, ricas em biodiversidade e fortes em serviços de ecossistema, têm sido os parentes pobres das políticas ambientais. O investimento tem sido maioritariamente no regadio e na intensificação da agricultura e na eucaliptização do país. O PDR investiu 20 milhões de euros no apoio à agricultura extensiva da Rede Natura 2000, mas ao mesmo tempo investiu mais de 600 milhões de euros no regadio e nos olivais intensivos. O próximo executivo tem de parar de investir na agricultura industrial e passar a investir nos agricultores que produzem alimentos de qualidade e salvaguardam a biodiversidade e a qualidade ambiental. Ao mesmo tempo é necessário investir na concretização dos Planos Regionais de Ordenamento Florestal com destaque para a concretização de um mosaico agroflorestal mais favorável à biodiversidade.
6. Valorizar as Áreas Protegidas e a Rede Natura 2000
As Áreas Protegidas (AP) estiveram quatro anos quase ao abandono, pese embora o tímido reforço dos Vigilantes da Natureza, que continuam a ser poucos para as tarefas que tem a seu cargo. São inúmeros os casos em que o Ministério do Ambiente e os organismos que tutela não fizeram o suficiente para a sua proteção. Algumas arderam, como a serra do Açor, outras afundaram, como o mouchão da Póvoa no estuário do Tejo, muitas outras ainda foram tomadas por empresas mineiras, agrícolas, aeroportuárias, hoteleiras, etc.
A Natura 2000, a grande rede Europeia de áreas protegidas, continua muito mal implementada no nosso país, não só nos meios marinhos, mas também nos terrestres. Estas graves insuficiências resultaram mesmo em várias condenações de Portugal no Tribunal Europeu. Na próxima legislatura o Ministro do Ambiente tem obrigatoriamente de colocar a defesa das áreas protegidas à frente dos interesses económicos imediatos. Tem também obrigação de concluir o processo de designação das áreas da Rede Natura 2000, e de munir cada uma com os instrumentos de gestão necessários.
Ainda vamos a tempo de recuperar o tempo perdido, se todas estas propostas constarem do programa do próximo executivo. Esperamos que seja equacionado um maior investimento na conservação da natureza, com a proteção e gestão efetiva das nossas áreas naturais.