Alterações climáticas podem provocar incêndios mais destruidores em Portugal
Investigadores norte-americanos alertam que Portugal vive uma “nova era” de incêndios florestais de maiores dimensões e com maior poder de destruição, com riscos potenciados pelas alterações climáticas.
Esta é a principal conclusão de um estudo acerca da temática dos incêndios florestais em Portugal, cujos resultados foram hoje apresentados no Instituto Superior de Agronomia de Lisboa.
Os autores do estudo, Mark Beighley e Albert C. Hyde, já tinham feito uma investigação similiar em Portugal em 2009, altura em que previam que na próxima década “deve ser levado muito a sério o risco da ocorrência de uma época de incêndios catastrófica, consumindo uma área igual ou superior a 500.000 hectares”. Certo é que os incêndios de 2017 resultaram em cerca de 460.000 hectares ardidos.
Os dois especialistas incluem agora, no relatório de 2018, um novo e pior cenário de fogos que podem atingir os 750.000 hectares de área ardida, na próxima década, designou de “Black Sies“.
Riscos acrescidos e causa desconhecida
Para esta previsão, os cientistas relevam os riscos acrescidos provocados por quatro causas que têm vindo a agravar-se nos últimos anos: a elevada percentagem de área florestal não gerida; o aumento da quantidade e extensão das cargas combustíveis; o elevado número de ignições indesejadas em condições de incêndio moderadas a graves; e as alterações climáticas e períodos crescentes de tempo quente e seco.
Apesar das alterações climáticas e os fenómenos meteorológicos severos serem importantes na ocorrência de incêndios florestais destruidores, “não são os únicos fatores relevantes”. “As alterações climáticas podem ser o perigo global mais evidente de incêndio, mas, ao longo das últimas décadas, têm-se registado outras modificações significativas com efeitos prejudiciais continuados no potencial de incêndios florestais, sendo certo que o aumento da área ardida em Portugal se tornou mais relevante em toda a Europa”, garante os autores.
E um dos fatores que os autores consideram que não pode ser ignorado é o risco humano. As ignições de origem humana são responsáveis por 98% de todos os incêndios.
O estudo refere que: “Portugal apresenta um número desproporcionalmente elevado de ignições de origem humana relativamente à população. A boa notícia é que o número anual de ignições em Portugal tem vindo a diminuir desde 2003 – embora ainda seja demasiado elevado durante períodos pirometeorológicos moderados a graves”.
Os autores chamam ainda a atenção para o facto de, na maior parte dos incêndios em Portugal, a causa permanecer desconhecida. Das 423.756 ocorrências registadas entre 2001 e 2017, apenas 27% têm uma causa identificada. Cerca de 59% dos incêndios nunca são investigados e em 14%, as provas são insuficientes para determinação da respetiva causa.
Falta de know-how
O relatório concluí que embora não exista “uma solução milagrosa única para o dilema em que Portugal se encontra atualmente face à ameaça de incêndio catastrófico”, há um longo caminho a percorrer em termos de melhorias estratégias de prevenção e controlo dos incêndios, nomeadamente, aumentar o know-how.
“Portugal não possui claramente know-how ou forças de especialistas em incêndios e meteorologistas suficientes para a gestão eficaz de grandes incêndios. Não é possível conseguir uma integração eficiente da assistência que será requerida a outros países europeus sem adotar um sistema de comando de incidentes universalmente reconhecido. A não implementação atempada de estratégias preparatórias para enfrentar um evento desta natureza seria indesculpável. Para fazer face a anos extremos de incêndio e cenários Black Skies ainda é necessário maior planeamento do combate, restruturação organizacional, prevenção e estratégias de redução dos combustíveis”, concluem os investigadores.