As empresas do setor da água e da energia têm vindo a aproveitar cada vez mais as mais-valias da tecnologia em seu benefício, procurando um caminho certeiro rumo à sustentabilidade e à eficácia. A Ambiente Magazine falou com algumas empresas e entidades para ficar a par das mais recentes soluções destes setores a nível tecnológico. Leia aqui a 1ª parte deste trabalho
A Filotipo, que desde 2009 disponibiliza no mercado soluções de eficiência energética e hídrica, acredita que as novas tecnologias disponíveis no mercado têm despertado a atenção das empresas do setor da água e da energia em Portugal. Isso mesmo nos diz João Paulo Mesquita, business director & partner da Filotipo, que garante que, a nível europeu, esta procura pela inovação tecnológica é uma prática corrente que já está enraizada na cultura das empresas. “Todos os dias lemos notícias de empresas que desenvolveram mais uma tecnologia, com o propósito da racionalização dos consumos de água e de energia, rumo à descarbonização”, explica. E também a nível governamental a sustentabilidade passou a ser uma prioridade, diz, dando exemplo do Governo holandês que, muito recentemente revelou uma estratégia inovadora para garantir a distribuição de água potável, através do tratamento de águas cinzentas.
Na Filotipo a busca por soluções disruptivas é uma constante e o João Paulo Mesquita confirma um investimento prioritário a nível tecnológico, que passa por “criar estratégicas com empresas que disponibilizam soluções tecnológicas de topo, devidamente testadas e acreditadas”. Para o responsável, “num mercado tão competitivo, sem o investimento tecnológico, não teríamos como nos diferenciar, seria muito difícil oferecer o valor acrescentado que o cliente espera que lhe entreguemos”.
No que diz respeito às empresas que atuam no setor da água em Portugal, Jorge Cardoso Gonçalves, presidente da APRH (Associação Portuguesa de Recursos Hídricos), reconhece que para se manterem atualizadas e estarem preparadas para o atual contexto de incerteza, terão de combinar “um conjunto de soluções – algumas soluções que já utilizam e outras que gradualmente terão de começar a utilizar”. E destaca aqui “a importância da gestão das infraestruturas hidráulicas construídas, da otimização operacional e da recuperação de custos, colocando na equação a ‘bomba-relógio’ da não renovação dos sistemas em envelhecimento constante, com componentes que começam a atingir o seu tempo de vida”. Por isso considera que a atualização tecnológica das entidades gestoras e a evolução das soluções disponíveis para apoiarem a exploração, a reabilitação e o reforço das infraestruturas são “elementos cruciais nesta fase dos serviços de águas em Portugal”.
O responsável esclarece que a evolução tecnológica dos sistemas de monitorização e controlo das infraestruturas permite otimizar a gestão operacional, reduzindo tempos de resposta, incrementando a qualidade do serviço, protegendo o ambiente, combatendo as perdas de água ou controlando as afluências indevidas. E sublinha que a Inteligência Artificial (IA) poderá desempenhar um papel fundamental no tratamento de dados, cujo volume hoje é enorme, e na sua conversão em informação útil à tomada de decisão, tornando-a menos reativa e mais sustentada.
Os desafios do setor energético
Se é verdade que algumas empresas portuguesas energéticas não atingem a escala das grandes empresas europeias, também é verdade que se destacam pela agilidade e inovação. É o que nos diz Luísa Matos, CEO da Cleanwatts, que garante que “a nossa tecnologia está frequentemente a par ou à frente dos nossos pares europeus, particularmente na integração de renováveis, modelos de energia comunitária e soluções de redes inteligentes”. Concretamente na Cleanwatts, a gestora esclarece que as abordagens inovadoras às comunidades de energia e soluções descentralizadas “estão a despertar a atenção da Europa”.
Embora admita que o compromisso de Portugal para com as energias renováveis seja evidente, sendo que em 2024, 84,1% da energia do país provém de fontes de energia renováveis, o que nos coloca na vanguarda da adoção deste tipo de energia a nível mundial, Luísa Matos lembra que existem desafios. “Em algumas áreas de ponta, como a gestão da rede baseada em IA e a adoção de mercados de flexibilidade, ainda estamos a recuperar o atraso”.
A nível energético, a responsável aponta tecnologias importantes como o armazenamento de energia em baterias, o carregamento de veículos elétricos e controlo inteligente da climatização, que podem alterar a procura de energia para corresponder à oferta. E não tem dúvidas de que “a tecnologia está no centro do setor da energia sustentável”. Mas frisa que este não será o principal desafio, apontando o dedo à “falta de modelos de negócio comercialmente viáveis” e ao facto de o setor ser “altamente regulamentado e lento”.
Luísa Matos refere que os enquadramentos regulatórios só agora estão a começar a recuperar o atraso: o Pacote Energia Limpa da UE forneceu orientações iniciais mas muitos países, incluindo Portugal, ainda estão a tentar perceber como implementá-los a nível nacional. “Este contexto regulatório incipiente significa que não estamos apenas a inovar tecnologicamente, mas também a ajudar a definir o próprio mercado em que estamos a operar”, indica.
Um compromisso com a inovação e a digitalização
Já Ricardo Jorge Santos, responsável de Inovação da E-Redes, considera que as empresas do setor energético em Portugal “têm um compromisso com a inovação e a digitalização, recorrendo à utilização de tecnologias que lhes permita manter-se atualizadas e na vanguarda do setor”. E dá o exemplo concreto de novas tecnologias utilizadas pela E-redes, nomeadamente, a utilização de drones na inspeção da rede elétrica, em alternativa ao uso tradicional do helicóptero, que permite uma “maior eficiência e segurança”. Por outro lado, diz, Portugal e a E-Redes têm-se destacado na implementação de redes inteligentes, com o rol out de contadores inteligentes em todo o país até finais de 2024.
O responsável não tem dúvidas de que a tecnologia desempenha um papel crucial na promoção da sustentabilidade deste setor. Relembrando o uso dos drones nas inspeções da rede aérea, garante que se trata de uma abordagem inovadora que contribui para a redução das emissões de gases de efeito estufa. Por outro lado, a monitorização online das rede de baixa tensão permite, refere Ricardo Jorge Santos, diminuir as perdas de energia nas redes e detetar e combater fraudes, aumentando assim “a eficiência da rede” e reduzindo “o desperdício de energia, contribuindo assim para a sustentabilidade do setor”.
O investimento tecnológico é uma prioridade para enfrentar os desafios do setor e tornar a transição energética uma realidade, sublinha o interlocutor. E aponta a inovação como sendo fundamental para o negócio, quer a nível da transição energética (tecnologias que permitam a produção, distribuição e consumo de energia a partir de fontes renováveis de forma eficiente); da digitalização (permite uma gestão mais eficiente e inteligente da energia); da eficiência energética (soluções que reduzam o consumo de energia e as emissões de gases de efeito estufa); da competitividade (desenvolvimento de novos produtos e serviços) e da sustentabilidade (soluções que permitam um uso mais sustentável da energia).
Ricardo Jorge Santos não tem dúvidas de que a inovação tecnológica é “mais do que uma prioridade, é uma necessidade para garantir a segurança e a qualidade do fornecimento de energia e para contribuir para a sustentabilidade do planeta”. Inovação que a E-Redes concretiza através de parcerias com startups, que permite aceder a novas tendências, fora do circuito da indústria convencional, bem como da proximidade com a academia, envolvendo-se em vários projetos europeus que lhe têm permitido “estar na vanguarda das novas tecnologias e soluções para o setor energético”.
Por Inês Gromicho, publicado na edição 106 da Ambiente Magazine