“Agricultura de precisão” é uma das soluções para o setor agroflorestal em contexto de alterações climáticas

Numa altura em que os efeitos das alterações climáticas já são uma realidade, o presidente do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), Miguel Miranda, alerta para a importância de se prepararem vários cenários, onde alguns podem ser “francamente maus”. O responsável falou na mesa-redonda da conferência “Alterações climáticas: que desafios para o setor agroflorestal nos próximos anos”, realizada esta terça-feira no auditório da reitoria da Universidade Nova de Lisboa.

“Não temos mais tempo para discutir dúvidas: vamos ter que ter políticas e perspetivas que sejam um bocadinho precaucionárias. Temos de nos preparar para vários cenários, e alguns podem ser particularmente gravosos”, alertou. E um dos problemas pode mesmo ser a “segurança alimentar” e o risco de “não haver alimentos”, indicou o especialista, chamando a atenção para os “efeitos perversos” como a variação de preços: “Chegamos a uma situação em que, mais uma vez, e não é agricultura, mas todas as áreas relacionadas com o setor primário, têm de começar a preparar-se para situações que podem ser de alguma disrupção”.

O especialista sublinhou a importância para a não dependência dos recusos: “Vamos ter problemas de água doce e de solos e temos de nos preparar para dizer que as soluções serão baseadas na ciência e na tecnologia”, com a “diferença subtil” de respeitar o meio natural mas sem depender dele.

[blockquote style=”2″]Como se faz uma gestão florestal se não temos um inventário e um cadastro florestal? [/blockquote]

Quem também marcou presença na conferência foi o presidente do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável (CNADS), Filipe Duarte Santos, que parece não ter dúvidas sobre o “enorme desafio” que é adaptar a agricultura às alterações climáticas, principalmente, num clima mediterrânico, com a precipitação a diminuir anualmente. O especialista em alterações climáticas atenta na importância de “melhorar as disponibilidades de água”, partilhando da ideia de que a tecnologia vai ser fundamental, dando como exemplo, a “agricultura de precisão” e “a importância de uma maior atenção na gestão eficiente da água”. Contudo na questão tecnológica, Filipe Duarte Santos sustenta que “não basta existirem fundos disponíveis para que a tecnologia seja adotada: é preciso conhecer, transferir as melhores práticas e capacitar os agricultores para a adoção de tecnologias”. Acresce ainda o problema da legislação: “Somos mais inclinados para a vertente regulatória do que para a vertente dos incentivos e os incentivos são muito importantes neste setor”.

Sobre florestas, o desafio também não é pequeno. “Desempenhando um papel muito importante na mitigação e no sequestro do carbono”, as florestas enfrentam problemas acrescidos nas zonas mediterrânicas: “Não sabemos prever quando é que vamos ter uma combinação de seca com uma onda de calor, o que propicia incêndios florestais de grande dimensão”, alerta o especialista. Mesmo com os esforços de reflorestação e de prevenção de incêndios florestais, Filipe Duarte Santos sublinha a importância de existir um “inventário florestal” e que este seja atualizado regularmente: “Como se faz uma gestão florestal se não temos um inventário e um cadastro florestal?”.

Também, Filipa Saldanha, subdiretora do Programa Gulbenkian de Desenvolvimento Sustentável, parece concordar com a importância da “adoção de novas tecnologias” para “medir e aumentar a eficiência da gestão de água” no setor agroalimentar. Um estudo encomendado pela Fundação Gulbenkian com enfoque no setor agroalimentar mostra que, em Portugal, “71% dos agricultores ainda não medem a água que utilizam” e “66% precisam de apoio em contexto de proximidade para começar a adotar tais tecnologias, como a agricultura de precisão”.

António Costa e Silva, presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento do Plano de Recuperação e Resiliência, que partilha da visão de que o planeta está numa situação de “grande urgência”, acredita, contudo, na capacidade humana em “criar” e “desenvolver” novas ideias. No caso do setor agroflorestal, o responsável também parece concordar com a importância de existir “mais conhecimento, mais tecnologia, mais ciência e mais modernização”, para o setor.