Decorridos três meses desde o arranque do projeto, a análise de mais de 200 amostras de águas residuais recolhidas à entrada e à saída das estações de tratamento de águas residuais monitorizadas, um terço das amostras previstas analisadas no âmbito do projeto, comprova a presença de material genético nos afluentes que chegam às ETAR, sendo detetadas cargas virais proporcionais às concentrações reportadas por estudos semelhantes em curso noutros países.
Em comunicado, a AdP – Águas de Portugal refere que os resultados evidenciam ainda a “ausência de deteção do material genético do vírus SARS-CoV-2 noefluente tratado de qualquer uma das cinco ETAR envolvidas no estudo”, o que sugere que as etapas do tratamento são “eficientes na remoção do genoma viral do efluente”.
A metodologia desenvolvida e otimizada para a deteção de SARS-CoV-2 no âmbito do COVIDETECT tem obtido elevada “eficiência de recuperação de material genético”, garantindo assim a fiabilidade dos resultados obtidos, refere o mesmo comunicado.
De salientar que a deteção de material genético do vírus nas águas residuais à entrada das ETAR, não significa que o vírus se encontre infecioso ou ativo e que se possa propagar por via hídrica. De facto, não existe evidência à data da possibilidade de infeção por SARS-CoV-2 através desta via.
As estações de tratamento incluídas na primeira fase deste estudo estão localizadas nos grandes centros urbanos de Lisboa, Cascais, Gaia e Guimarães, servindo cerca de 20% do total da população nacional e abrangendo as regiões com maior número de casos de Covid-19. Adicionalmente, monitoriza-se a circulação do vírus nas redes de drenagem dos efluentes do Hospital Curry Cabral, do Hospital Eduardo Santos Silva, em Vila Nova de Gaia, e do Hospital Senhora da Oliveira, em Guimarães. No âmbito
da atividade 3 do projeto, em fase inicial de implementação, serão desenvolvidos estudos de associação das cargas virais detetadas com a população infetada em cada área servida por cada uma das ETAR, bem como com o número de doentes hospitalizados em cada unidade de saúde. Este processo visa estabelecer correlações entre a população infetada que potencialmente excreta vírus através das fezes e das secreções orofaríngeas com as cargas virais em circulação nos sistemas de saneamento.
Lançado em abril passado, o COVIDETECT tem como objetivo implementar um sistema de alerta precoce da circulação do vírus SARS-CoV-2, agente etiológico da COVID-19, na comunidade, através da vigilância dos sistemas de saneamento, que poderá contribuir para a mitigação de eventuais novos surtos da doença.
O projeto é coordenado pela AdP e desenvolvido por um consórcio onde se integram a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, entidade que assegura a coordenação científica do projeto e as atividades de modelação da dinâmica de SARS-CoV-2 na rede de saneamento, modelação eco epidemiológica e caracterização molecular do vírus; o Laboratório de Análises do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa, responsável pelo desenvolvimento das metodologias para a deteção e quantificação do SARS-CoV-2 nas águas residuais; e as empresas Águas do Tejo Atlântico, Águas do Norte e SIMDOURO, enquanto entidades gestoras de sistemas de saneamento das principais áreas metropolitanas do país.
A Direção-Geral da Saúde integra o Advisory Board, bem como a EPAL, a Águas do Douro e Paiva, a APA – Agência Portuguesa para o Ambiente e a ERSAR – Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos.
Segundo a AdP, numa altura em que se torna óbvio o valor da informação de base científica e a sua importância no processo de tomada de decisão, este projeto visa dar um “contributo decisivo também na definição de estratégias de monitorização nas situações de desconfinamento e contingência”, permitindo “avançar com maior segurança nos passos progressivamente dados na retoma da atividade laboral, social e cultural”.
Uma vez que os indivíduos infetados, com sinais clínicos de doença ou assintomáticos, excretam o vírus nas fezes e nas secreções respiratórias, a água residual oferece uma excelente janela de oportunidade para se obter informação sobre a circulação do vírus na comunidade, pelo que os resultados deste projeto, com
potencial de replicação para uma escala mais ampla, serão úteis para a vigilância epidemiológica da população por via indireta. Acresce que os indivíduos infetados excretam o vírus vários dias antes do aparecimento de sintomas, pelo que a implementação desta ferramenta de alerta precoce poderá contribuir de forma determinante para a implementação atempada de medidas de saúde pública preventivas nas populações das áreas geográficas em estudo.
O projeto COVIDETECT, anunciado em abril passado pelo Ministério do Ambiente e Ação Climática, é financiado através do programa Compete 2020 no âmbito do Sistema de Incentivos a Atividades de Investigação e Desenvolvimento e ao Investimento em Infraestruturas de Ensaio e Otimização (upscaling) no contexto da Covid -19, ao abrigo do Aviso AAC 15/SI/2020, de 20 de abril de 2020. Este projeto insere-se numa iniciativa nacional e pan-europeia considerada estratégica para a preparação dos países afetados para eventuais futuras vagas epidémicas, sendo uma ferramenta de deteção, quantificação, caracterização e modelação do vírus através da análise da sua presença nas ETAR.