Os resultados de um estudo promovido pela empresa Águas de Portugal (AdP) revelam que existem incoerências entre as atitudes e os comportamentos dos consumidores face à água. E a relação da água com a energia é, para muitos, pouco clara.
Foi justamente para pôr à discussão os problemas de informação e incentivo aos cidadãos para a eficiência hídrica e energética que, integrado na primeira edição da Grande Conferência Água & Energia 2018 promovida pela Agência para a Energia (ADENE), se promoveu o “debate de experiências Água-Energia”, com o mote: “Como informar e incentivar os cidadãos para a eficiência hídrica e energética?”.
“O preço da água pesa muito pouco no orçamento familiar”
Foi Isabel Oliveira, coordenadora de estudos técnicos da DECOPROTESTE, quem tomou a palavra para falar sobre o estudo daquela associação para a ADENE. O objetivo foi perceber os níveis de literacia energética dos portugueses e o inquérito acabou por revelar que os consumidores não acediam a fontes de informação sobre energia por desconhecimento ou desinteresse. “Quando perguntámos se existia alguma relação entre o consumo de água e energia, cerca de 40% das pessoas disseram que não havia relação”, exemplificou. E os que respondiam que havia uma relação, esta “não era muito clara”.
O diretor-geral da Energia e Geologia percebe esta “ausência de informação” nos cidadãos. João Bernardo indica que “a relação entre o setor água e energia”, bem como “o problema do consumo e do custo da água”, são “problemas recentes”. O responsável político para área da energia indica que os consumidores não dão “valor” à água. “Não tem um custo muito grande” apesar de o político indicar que “grande parte do consumo de energia elétrica em Portugal está no setor da água. É necessário que os cidadãos tenham consciência” e, por consequência, torna-se necessário “conseguir uma quantificação” desse custo.
João Nunes Mendes, presidente da Águas de Portugal (AdP), diz que a quantificação desse custo não basta. É que, segundo o estudo “Atitudes e Comportamento dos Portugueses face à Água”, desenvolvido pelo grupo, os consumidores reconhecem que há um uso excessivo da água e que situações de seca levam a um aumento no custo. “A questão da disponibilidade da água é uma matéria crítica. E nós somos um país particularmente atingido pelas alterações climáticas”. No entanto, “o preço da água pesa muito pouco no orçamento familiar”. Os consumidores reconhecem que um aumento do preço pode levar a um consumo mais sustentável mas “não estão disponíveis para pagar mais pela água”.
“Temos bases para potenciar um nexus entre água e energia”
Nuno Lacasta sugere que uma forma de poupança de água é a sua reutilização. O presidente do Conselho Diretivo da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) refere que o país tem apenas “menos de 1% de reutilização da água”. O responsável reforça ainda a necessidade de distinguir os usos da água para uso agrícola e urbano. Defendendo a aposta de um “nexus energia-água” ao nível do edifício, isto é, a introdução de investimentos que possam refletir um consumo eficiente de energia e água do edifício, algo que é designado por “Near Zero Resources Buildings”, Nuno Lacasta acredita que “temos hoje as bases montadas para potenciar este nexus”. E o Estado pode fazer a diferença. “Os organismos públicos e privados perceberem que um investimento hoje, paga-se a si próprio em pouco mais de cinco anos”.
Já Luís Seca, co-coordenador do Centro de Sistemas de Energia do INESC-TEC acredita que os consumidores “têm mais predisposição” à alteração dos seus comportamentos “se isso contribuir para ajudar o meio ambiente”. No entanto, quando confrontadas com custos, a vontade não é a mesma. “Existe uma tendência para pensar muito bem nos investimentos”, considera o investigador, que indica que a “procura” por equipamentos ou outras tecnologias passa muito pelo comportamento do consumidor. “A consciência das pessoas, desde o processo de troca de equipamento até à forma como o usam, é que terá maior impacto do lado da procura”, explica.
Necessidade de literacia energética para uma melhor compreensão da energia
Para além das conclusões do estudo da DECO Proteste para a ADENE, verificou-se, ainda, que havia a necessidade de criar um instrumento capaz de responder às “falhas” dos consumidores no que toca ao “nexus água e energia”. É desta “falha” que surge o CINERGIA, Centro de Informação para a Energia, uma iniciativa que envolve a ADENE e vários parceiros públicos e privados.
Coube a Miguel Sales Dias, administrador da ADENE, fazer o lançamento desta iniciativa que envolve a disponibilização de informação online e a criação de um espaço físico ligado ao projeto na sede da ADENE. Pretende-se dar a todos os consumidores de energia “uma visão integrada do setor energético, contribuindo para o aumento da literacia energética”. Além disso, também disponibiliza uma narrativa didática sobre o setor, “desde as formas, fontes e produção de energia, passando pelo transporte, distribuição, armazenamento e comercialização, até à utilização da energia pelos diversos setores de atividade e consumidores finais”, acrescenta.
O objetivo final será aumentar a literacia energética, sendo que este projeto é dirigido a todos os públicos, desde famílias, estudantes e professores a instituições públicas e privadas do setor, empresas, universidades e centros de investigação.