A ligação entre a poluição do ar e a demência tem sido polémica entre os cientistas, mesmo quando os seus defensores dizem que é necessária mais investigação para confirmar esta relação causal e saber precisamente como as partículas poluentes invadem o nosso cérebro e o danificam, avança hoje o Expresso. Mas um estudo epidemiológico americano que durou 11 anos, liderado por Jiu-Chiuan Chen, da Universidade da Califórnia do Sul, conclui que viver em cidades com uma exposição às partículas poluentes PM2.5 mais elevada do que o limite-padrão definido pelas agências de proteção do ambiente – 12 microgramas por metro cúbico de ar (um micrograma é um grama a dividir por um milhão) – duplica o risco de demência nas mulheres idosas. Esta descoberta, se for generalizada a toda a população da Terra, revela que a poluição do ar pode provocar 21% dos casos de demência no mundo.
Os resultados do estudo, que se apoiou também em experiências com ratos de laboratório expostos à inalação de PM2.5, foram revelados na revista científica Transalational Psychiatry (grupo Nature). Até agora, já era consensual na comunidade científica o risco de se contrair asma, o cancro de pulmão ou doenças de coração por causa da inalação de partículas poluentes finas e ultrafinas como a PM2.5, gerada pela pela atividade industrial e pelos combustíveis fósseis. Mas provar que a demência nos idosos e a doença de Alzheimer são provocadas pela mesma causa é um desafio mais complexo.
Ana Cristina Rego, professorra da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e investigadora do Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC), aponta limitações ao trabalho feito pela equipa americana, em especial porque “continuamos sem saber qual é o mecanismo que pode levar essas partículas a entrarem no interior do nosso cérebro”.
Esta área de pesquisa “é muito, muito nova”, avisa Michelle Block, neurocientista da Universidade de Indiana (Indianapolis, EUA), citada pela revista Science. Mas “estamos num tempo muito estimulante para se estudarem as conexões entre a poluição e o cérebro e se estas forem reais, darão aos especialistas em saúde pública uma ferramenta para reduzirem os riscos da doença de Alzheimer, uma pespetiva bem-vinda para uma doença que é tão devastadora e que, por enquanto, não tem tratamento”.