Em 18 de setembro de 2015, a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (US EPA) anunciou que o Grupo Volkswagen (VWG) tinha violado a sua legislação de emissões usando software ilegal (um dispositivo manipulador) para enganar os testes de emissões. O dispositivo reconhecia que um veículo estava a ser submetido a um teste de laboratório e baixava as emissões de óxidos de azoto (NOx) para que o veículo atingisse o rigoroso limite legal dos EUA. Na estrada, o mesmo veículo produzia até 40 vezes mais emissões de NOx. Desde então, a VW admitiu que a empresa equipou 11 milhões de veículos em todo o mundo com o software ilegal: 8,5 milhões na Europa (e 500 mil nos EUA).
Nos últimos 12 meses, investigações na Europa (nomeadamente os programas de testes na Alemanha, França e Reino Unido) têm mostrado que o escândalo envolvendo a VW representa a ponta de um icebergue, indica a associação ambientalista Zero. A maioria dos fabricantes manipula sistematicamente os automóveis para passar nos testes de emissões através de meios altamente questionáveis e provavelmente ilegais. Isso resulta em desempenhos que cumprem os limites legais em laboratório, mas que os excede em pelo menos 10 vezes quando as emissões são medidas na estrada. Tal comportamento arrasta-se há pelo menos seis anos ou mais, adiantos ambientalistas.
Coincidindo com o primeiro aniversário do escândalo “dieselgate”, um relatório da Federação Europeia de Transportes e Ambiente (T&E) expõe o incumprimento das normas de emissões europeias relativas aos óxidos de azoto (NOx) por veículos ligeiros em estrada. O estudo agora divulgado estima que existam cerca de 29 milhões de automóveis a gasóleo das normas Euro 5 e Euro 6 com emissões excessivas (ligeiros de passageiros e de mercadorias) nas estradas europeias, o que corresponde a cerca de 76% de todos os veículos a gasóleo registados ao longo dos 5 anos avaliados. Estes automóveis irão tipicamente circular na estrada 10 a 15 anos. Mais de quatro em cada cinco dos automóveis vendidos entre 2010 e 2014 que deveriam cumprir a norma Euro 5 relativamente às emissões de NOx (180 mg/km em ensaio em laboratórios) produzem mais de três vezes este nível quando conduzidos em estrada. Dois terços dos veículos da norma Euro 6 (à venda desde 2015) ainda produzem mais de três vezes o limite de 80 mg/km quando conduzidos em estrada.
Para Portugal, o valor estimado é de 376 mil automóveis com emissões excessivas (295 mil da norma Euro 5 e 81 mil da norma Euro 6). Portugal ocupa a 11ª posição na Europa em termos de número de veículos nestas condições, ocupando a França a primeira posição, seguida da Alemanha e Reino Unido, sublinha a Zero.
As razões para as emissões excessivas prendem-se nomeadamente com o não funcionamento do tratamento de gases abaixo de determinada temperatura, a maiores emissões quando se liga o motor a quente, ou pelo facto de apenas funcionar quando deteta que esteja a ser efetuado um ciclo de testes.
O desempenho das diferentes marcas
O relatório do T&E identifica ainda quais são as piores marcas em termos de emissões. Para veículos de norma Euro 5, fabricados entre 2010 e 2014, as cinco empresas com pior desempenho foram (por ordem decrescente a partir das emissões mais altas): Renault (incluindo Dacia); Land Rover, Hyundai, Opel/Vauxhall (incluindo Chevrolet) e Nissan. Os melhores desempenhos (por ordem crescente a partir das emissões mais baixas): Seat, Honda, BMW (incluindo Mini), Ford e Peugeot.
Para os atuais automóveis de norma Euro 6, identifica-se um diferente padrão. Os piores desempenhos são: Fiat (incluindo Alfa Romeo + Suzuki, motores fornecidos pela Fiat); Renault (incluindo Nissan, Dacia e Infiniti); Opel/Vauxhall, Hyundai e Mercedes. Curiosamente, a empresa que produz os automóveis Euro 6 mais limpos é o grupo VW, seguida pela Seat, Skoda e Audi, BMW (incluindo Mini) e Mazda. No entanto, isso não é resultado de uma reação da VW ao escândalo dado que estes veículos começaram a ser comercializados há mais de um ano.
470 mortes/ano em Portugal e excedências aos valores-limite em Lisboa e Porto
Um relatório da Agência Europeia do Ambiente do ano passado aponta para um total de 470 mortes prematuras por ano associadas ao dióxido de azoto (NO2), o composto mais problemático associado às emissões de óxidos de azoto (NOx). O NO2 é um gás tóxico perigoso, que, quando inalado em níveis elevados por um curto período, provoca uma série de efeitos respiratórios adversos, incluindo inflamação das vias aéreas em pessoas saudáveis e aumento dos problemas respiratórios em pessoas com asma ou outras doenças respiratórias pré-existentes. A exposição de longo prazo contribui para o cancro do pulmão e está também relacionada com uma variedade de anomalias em crianças.
Em 2015, as estações de monitorização da qualidade do ar da Avenida da Liberdade em Lisboa e de Francisco Sá Carneiro/Campanhã, localizadas em ambiente de tráfego, e portanto fortemente influenciadas pelas emissões dos veículos a gasóleo, ultrapassaram os valores-limites diário e/ou anual. Em 2016, os resultados provisórios apontam no mesmo sentido. A Comissão Europeia tem em curso um processo contra o Estado Português por incumprimento dos valores-limite de NO2.