Por: Bernardino Pinto, diretor geral da Contambiente
O PERSU 2030 – Plano Estratégico para os Resíduos Urbanos estabelece um conjunto de objetivos e metas muito ambiciosos, implicando um enorme esforço para os diferentes atores do setor, em especial para as entidades gestoras do serviço público de gestão de resíduos urbanos.
Muitos irão mais longe ao afirmar que tais metas são possíveis mas não para o horizonte 2030, basicamente porque implicam conseguir fazer em 7-8 anos aquilo que não se conseguiu em várias décadas.
O cumprimento de metas está dependente do sucesso futuro da recolha seletiva de biorresíduos (que à data é ainda incipiente), aumento das taxas de desvio (com enfase nas recolhas porta-a-porta, mas que não são passíveis de aplicação em todas as estruturas urbanísticas), aumento da eficiência de triagem (quando nem todas as unidades carecem de modernização), sistema de tara retornável (positiva, mas que não pode ter uma escala comparável a uma rede de recolha), implementação do PAYT e/ou RAYR/SAYT (técnica e financeiramente complexa), entre outros.
Algumas opções estratégicas, como a insistência na problemática do CDR ou a menorização da importância da valorização energética, por exemplo, causam apreensão nos que pensam que os desafios do setor não serão resolvidos por outros fora do setor (como se constatou no passado) e que uma correta gestão de resíduos não se faz com dogmas mas com uma ótica integrada.
Mas em abono da verdade, não se pode ignorar que o PERSU 2030 não poderia divergir substantivamente das orientações comunitárias, da mesma forma que os Planos de Ação (PAPERSU) não poderão divergir do PERSU 2030. Otimismo ou pessimismo à parte, o importante é trilhar o caminho com convicção e determinação, fazer o máximo com os recursos disponíveis, e deixar os balanços para depois.
Mais discutível será penalizar financeiramente as entidades em função daquelas metas, ainda que a coberto de uma promessa de clemência para com os cumpridores. Neste domínio, a TGR é um caso paradigmático de um instrumento económico que funciona bem nas sebentas académicas, mas menos bem no mundo real.
Não vale a pena invocar a ineficácia da TGR em razão do seu “baixo” valor, pois este atinge já níveis desproporcionados (e com promessa de não parar). Basta atentar que a TRH sobre a utilização de água ou a TRH sobre a descarga de efluentes representam cerca de um décimo do valor da TGR. E todavia, poucos ousarão afirma que a água é um bem ambiental menos valioso.
A concretização de investimentos materiais e imateriais, a prever nos PAPERSU, é condição necessária ao atingimento das metas previstas no PERSU 2030, mas não suficiente.
Os investimentos materiais serão mais virados para a oferta do serviço (redes de recolha e infraestruturas de valorização), enquanto os investimentos imateriais mais virados para a procura do serviço (educação e sensibilização ambiental, p.e.) ou para a capacitação das entidades gestoras (sistemas de suporte à gestão e sistemas de otimização das operações de recolha). Prevê-se o seu respetivo cofinanciamento através dos Programas Regionais 2021-2027 do Portugal 2030.
No caso da gestão em baixa estamos a falar, por exemplo, na criação ou reforço de redes de recolha seletiva de biorresíduos, embalagens e novos fluxos (têxteis e perigosos domésticos, p.e.), na separação e reciclagem na origem (compostagem comunitária e doméstica), implementação de sistemas tarifários PAYT, SAYT ou RAYT (que serão obrigatórios, salvo se disposto em contrário nos futuros PAPERSU) e o reforço e requalificação da rede de ecocentros.
No caso da gestão em alta estamos a falar, por exemplo, da modernização de estações de triagem e outras visando mais e melhor recuperação de recicláveis e redução da fração residual, da reconversão de TMB para tratamento dedicado de biorresíduos e outros resíduos recolhidos seletivamente (ou a construção/ampliação de instalações de valorização de biorresíduos), da construção e aquisição de equipamentos para preparação e expedição de composto para mercado, da mineração de aterros sanitários para a recuperação de valorizáveis ou operações de encerramento e valorização ambiental de aterros sanitários.
Por outro lado, é condição necessária e suficiente à sustentabilidade do serviço o estabelecimento de sistemas tarifários que permitam assegurar a recuperação de custos, bem assim como o estabelecimento de valores de contrapartida do SIGRE que permitam uma adequada responsabilização do produtor através do pagamento dos gastos efetivos, evitando assim que seja a tarifa paga pelo cidadão a cobrir esse défice.
Este artigo foi incluído na edição 100 da Ambiente Magazine