Com a época de elevado risco de incêndios a aproximar-se a passos largos, Portugal volta a estar alerta para os perigos nas zonas rurais e florestais. A Ambiente Magazine está a auscultar vários especialistas da área para perceber o que está a ser feito neste âmbito e como se encontra o nosso país para dar resposta a este desafio.
Enquanto “fenómenos naturais frequentes nas regiões mediterrânicas” os incêndios dependem de um conjunto vasto de fatores que influenciam a sua ocorrência e propagação, sendo a “prevenção” e a “gestão florestal ativa” fundamentais para se enfrentar uma época de incêndios. Quem o diz é João Paulo Catarino, secretário de Estado da Conservação da Natureza e Florestas, que citando os dados da Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais, constata a existência, nos últimos anos, de “um maior equilíbrio entre o investimento em prevenção face ao investimento em combate”, verificando-se também que o “investimento global nestas duas rubricas tem vindo a subir de forma sustentada desde 2017”.
Na campanha, que se iniciou em outubro de 2022 e se estendeu até maio deste ano, o secretário de Estado dá nota do “vasto conjunto de ações de prevenção estrutural” que foram levadas a cabo, como a “instalação de 8 mil hectares de rede primária, representando um aumento de 18 % face à campanha anterior”; o “aumento de 13 %, face à campanha anterior, de mosaicos executados em áreas estratégicas”, a “execução de mais 10 mil km de caminhos da Rede viária florestal e de mais de 15 mil hectares de ações de fogo controlado e queimadas”, bem como a “a instalação de mais de 50 % da rede primária em territórios prioritários”, desde 2018.
Também, no âmbito das competências do ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, este organismo assegura 18 % dos efetivos do Dispositivo Especial de Combate a Incêndios Rurais para 2023, sob a coordenação da ANEPC – Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil, encontrando-se afetos à gestão de fogos rurais em 2023: “2.946 pessoas, dos quais 2.141 sapadores florestais; cerca de 640 viaturas envolvidas; 60 máquinas pesadas”, indica.
“Ainda é incerto de que modo as condições meteorológicas irão evoluir”
Apesar da ação e dos esforços, João Paulo Catarino atenta nos dados do IPMA -Instituto Português do Mar e da Atmosfera, que dão nota de uma situação de seca severa ou extrema em 36 % do território, em particular em áreas do Tejo, no Alentejo e Algarve: “Este contexto meteorológico exige naturalmente especiais cuidados da população face a comportamentos de risco”.
É precisamente este “contexto meteorológico de seca severa ou extrema” que justifica o facto de o primeiro incêndio ter ocorrido logo no início de abril, refere o responsável, relembrando que o mês de abril foi o “quarto mais quente em 92 anos”, tendo sido registada nesse mês a temperatura máxima do ar mais alta desde 1931: “No total de incêndios verificados este ano, 70% atingiram matos (66%) e áreas agrícolas (4%)”, segundo os dados do IPMA.
Num contexto exigente em termos meteorológicos e climáticos, João Paulo Catarino reitera para a necessidade de se “evitar a todo custo” os comportamentos de risco. Em termos de dispositivo de prevenção, os meios alocados foram os considerados necessários: “O mês de junho foi marcado por um período de chuvas que vieram melhorar os teores de humidade da vegetação, mas ainda é incerto de que modo as condições meteorológicas irão evoluir”. Dos indicadores disponíveis, no período de 2018 a 2022, existiu uma “redução para metade do número de incêndios, incluindo nos dias de pior meteorologia”, uma “diminuição dos incêndios por uso do fogo nos meses de verão” e, igualmente, uma “redução significativa de incêndios de maiores dimensões (500 a 1.000 hectares) e a redução da área ardida”, refere.
“É um elemento fundamental para o “planeamento das medidas de prevenção e combate a incêndios rurais”
Já sobre a Carta de Perigosidade de Incêndio Rural, o secretário de Estado da Conservação da Natureza e Florestas atenta que “não existiu qualquer suspensão na sua utilização geral”, estando disponível no Sistema Nacional de Informação Territorial, da Direção-Geral do Território: “O que foi efetivamente suspenso foi a aplicação das Áreas Prioritárias de Prevenção e Segurança, até à sua adaptação à realidade territorial regional, por parte das Comissões Sub-Regionais de Gestão Integrada de Fogos Rurais, como consta da nova lei”. Aliás, a Carta de Perigosidade é um “elemento fundamental” para o “planeamento das medidas de prevenção e combate a incêndios rurais”, por via do “ordenamento do território, do ordenamento florestal e da prevenção estrutural”, defende.
No combate aos incêndios rurais, o dirigente chamou ainda a atenção para as medidas preconizadas, especialmente no Conselho de Ministros de 1 de junho, que foram as consideradas necessárias para que se enquadre a aplicação da metodologia de adaptação das áreas prioritárias de prevenção e segurança. Uma outra medida que resulta dessa alteração prevê “a possibilidade de, em contexto de risco elevado e muito elevado, as empresas do setor agrícola e florestal realizarem trabalhos essenciais em espaços de floresta”, mediante proteção adicional e autorização da Proteção Civil Municipal, aponta.
Investimentos em marcha
No que concerne a investimentos que se encontram em marcha, João Paulo Catarino destaca um “conjunto complementar de apoios ao investimento”, essencialmente dirigido para a gestão florestal; “Encontram-se abertos, no PDR2020, 6 avisos para candidaturas, no valor de 63M€ de apoio, dos quais se destaca um montante de 20M€ especificamente dirigido para a instalação e manutenção de áreas de mosaicos de parcelas de gestão de combustíveis”.
No Conselho de Ministros de 1 de junho foi ainda decidido “reforçar o apoio ao funcionamento das equipas de sapadores florestais, aumentando o limite do apoio máximo de 45 para 55 mil euros”, tendo em conta o “aumento abrupto e conjuntural, verificado especialmente desde 2020, dos encargos com os recursos humanos e outros meios”, indispensáveis à atividade destas equipas. Atualmente, de acordo com o secretário de Estado, “existem 418 equipas de Sapadores Florestais, das quais 33 se encontram organizadas em 16 brigadas de SF, representando um total de 2.141 operacionais. A dotação global de verba afeta a apoiar este programa ascende a 24M€ em 2023”.
No que se refere aos investimentos a apoiar pelo PRR – Plano de Recuperação e Resiliência, no programa “Condomínios de Aldeia” estão aprovados 203 Condomínios, com um apoio de mais de 6 M€ em 51 Concelhos, sendo que o aviso de 2023, que foi subdividido em dois períodos para apresentação de candidaturas, com 20 M€, teve 117 candidaturas, que prevêem a intervenção em 473 aldeias e um valor proposto a financiamento superior a 19 M€: “Uma medida visa aumentar a resiliência dos territórios envolventes às aldeias situadas em territórios mais vulneráveis aos fogos rurais”.
Esteve ainda aberto até ao passado dia 15 de junho um aviso de 7M€ do Programa “Mais Floresta” direcionado para as Organizações de Produtores Florestais de Âmbito Regional, Municipal ou Local, para o reforço da sua capacidade de atuação em domínios essenciais para a sustentabilidade dos recursos florestais: “Através deste projeto prevê-se que sejam apoiados mais 100 técnicos superiores nas áreas das ciências florestais e ambientais”, refere.
Encontra-se, igualmente, prevista uma dotação de 3M€ no Fundo Ambiental para o Programa “Vales Floresta” que visa “apoiar projetos simplificados dirigidos aos pequenos proprietários florestais”, afinca.
Além destes apoios mais recentes, João Paulo Catarino partilha ainda a existência de um planeamento integrado por diversas fontes de financiamento (PRR, PDR2020, PEPAC, REACT EU, Fundo Ambiental) que visa “dar respostas estruturadas para as diversas dimensões de necessidades identificadas para o setor florestal”.