Os viajantes procuram cada vez mais fontes credíveis sobre sustentabilidade e marcas de hotéis que adotem uma abordagem holística, isto é, ir além das preocupações ambientais. Aquilo que já é “evidente” e “óbvio”, como o caixote para separar o plástico, o vidro ou o papel, não faz parte dos interesses dos turistas, mas sim algo que seja disruptivo: “66% consideram que apoiar as comunidades locais faz parte da viagem sustentável”. Os viajantes querem, assim, ver iniciativas de sustentabilidade que incluam o “envolvimento das comunidades locais”, onde a propriedade está inserida, tornando o hotel num “living lab” que envolve o cliente e a população que o rodeia. Estas são algumas das conclusões que fazem parte de um levantamento recente sobre o turismo sustentável a nível global e que foram reveladas por Inês Costa, especialista em ESG na Deloitte, na primeira edição das NEYA Sustainable Talks.
Tendo ainda como base a perspetiva do consumidor, os dados demonstram que o cliente tem a noção de que a responsabilidade é algo que deve ser partilhado, ou seja, não é só ao cliente que cabe assegurar a sustentabilidade do setor, mas também aos elementos governamentais ou às empresas: “37% considera que a responsabilidade por viagens sustentáveis tem que ser partilhada e 41% destacava os governos locais a assumir mais responsabilidade”. A informação de confiança é algo que o consumidor também procura cada vez mais, com 67% a querer ter mais informação por parte de quem presta o serviço: “Os viajantes confiam nas informações se as mesmas forem auditadas por terceiros”, indica Inês CostaO pagamento premium é algo que já começa a ter mais abertura por parte dos consumidores: “Até 5%, depois disso é difícil”. Apesar do “premium” poder ser uma barreira, os consumidores gostam de ver retorno dos seus comportamentos: “39% acredita que as marcas hoteleiras poderiam oferecer incentivos”.
as plataformas Booking e Expedia já testaram viagens sustentáveis e isso, agora, faz parte integrante dos sistemas de procura
Quanto à perspetiva do setor, os dados mostram que as empresas estão a fazer um forte investimento em sistemas de monitorização automatizados para tornar mais eficiente o uso de água e energia, além da utilização de tecnologias de energia renovável que vão para lá do painel fotovoltaico ou da turbina eólica. No caso da eficiência energética, destaca-se a “gestão automatizada de energia”, os “sistemas de monitorização em tempo real”, a “cogeração para reutilizar o excesso de calor dos geradores” ou o “sistema de climatização baseados em inteligência artificial”. Nas energias renováveis, hotéis na Alemanha e no Japão, por exemplo, já adaptaram a “tecnologia de célula combustível que utiliza hidrogénio verde” ou “gera a sua própria energia recorrendo a resíduos de plástico”, exemplifica a responsável. Na eficiência hídrica, os investimentos estão relacionados com a “reutilização” e a “redução da quantidade de água consumida por operação”, com destaque para os “sanitários de baixo fluxo”, os “contadores inteligentes”, os “sistemas de reutilização” ou ainda “programas de monitorização de diagnóstico” que, por exemplo, “a cada 15 minutos medem a quantidade água consumida no hotel”, permitindo perceber se “existem fugas, torneiras abertas”, entre outros. “Estes exemplos são demonstradores de poupanças substanciais”, referem os dados.
No que se refere à gestão de perdas de materiais, Inês Costa abordou o programa “HOSPES” da AHP (Associação Hotelaria de Portugal), considerando que o mesmo pode ser elevado a um patamar de maior reutilização e eficiência na utilização dos produtos e materiais. O estudo cita marcas que já utilizam, por exemplo, químicos menos intensivos e menos tóxicos: “A implementação de sistemas para redução deste tipo de utilização tem sido uma constante”, nota a especialista. As compras ecológicas são outra tendência bem presente, onde se demonstra um “efeito transformador rápido e de impacto para as empresas”. Voltando à informação, as plataformas Booking e Expedia já testaram viagens sustentáveis e isso, agora, faz parte integrante dos sistemas de procura. Também grandes marcas estão a trabalhar em rede no sentido de conseguirem alavancar boas práticas e passar informação para os seus concorrentes: “Grandes cadeias têm-se manifestado [para] implementar estas práticas”, refere Inês Costa.
“Se há boas práticas, há que partilhar
Tendo por base o “tipo de pensamento estratégico” implementado por parte de grande cadeias do turismo nacional, o levantamento da Deloitte indica que, apesar da estratégia de sustentabilidade estar já bem representada, a circularidade, o modelo de governança, as estratégias ‘net zero’, os ODS e as compras (ecológicas) estão muito pouco representadas: “Precisamos de um boost associado a este tipo de pensamento e integração de estratégias a nível de empresas”, atenta Inês Costa, relembrando que “os viajantes querem informação confiável, de fácil acesso e transparente, mais envolvimento com as comunidades locais e, que tudo isto, seja um novo normal”. “Apesar de o setor estar a tentar, ainda não sabe abordar estas questões de uma maneira sistemática e recorrente”, diz a especialista de ESG da Deloitte, acrescentando que traz muitos benefícios para o negócio, como “proteger e melhorar o negócio e o envolvimento dos viajantes”, a “experiência dos viajantes” ou “reduzir a complexidade do sistema” e dos “riscos associados ao negócio”.
Mas Inês Costa alerta que esta não é uma “transformação linear”, destacando que existem já fatores de sucesso: “(É preciso) melhorar o conhecimento, estudar os bons casos e dotar esse conhecimento para adaptar essas boas práticas ao contexto, compreender onde estão as vantagens e saber comunicar e ter capacidade de promover a mudança: se há boas práticas, há que partilhar”.
As empresas que até então não tinhas que reportar sobre a estratégia de sustentabilidade, agora vão ter de o fazer de uma forma mais exigente e sistemática
O levantamento da Deloitte teve como base o contexto da pandemia de Covid-19, com o turismo a ser dos setores mais abalados, havendo, contudo, uma “mini revolução escondida”, nem sempre evidente, com muitos gestores a pensarem no próximo passo. Assim, no levantamento, destaca-se a perspetiva do setor (empresários) e dos turistas que também puderam repensar em formas de viajar, além de várias tendências que começam a marcar o setor como o impacto dos negócios onde estão inseridos, as exigências dos clientes e a inovação nas suas mais variadas formas. Especialmente neste âmbito, há um “trio de ataque” que assenta na suficiência, eficiência e eficácia e é necessário encontrar um equilíbrio, até porque “não basta pensar na eficiência: temos de juntar suficiência e eficácia”, diz.
Todas estas tendências acabam por se concretizar de forma mais rápida, devido à “Diretiva de Sustentabilidade Corporativa”, que trará grandes mudanças a nível nacional: “As empresas que até então não tinhas que reportar sobre a estratégia de sustentabilidade, agora vão ter de o fazer de uma forma mais exigente e sistemática, inclusivamente integrando esses dados dentro do seu relatório de contas”, atenta Inês Costa, destacando que, “quem não o fizer, haverá uma perda de credibilidade do setor”. A isto, junta-se ainda a questão do risco: “Quando falamos de questões de sustentabilidade aplicadas nas empresas, estamos a falar de gerir riscos”. Por isso, deve-se reconhecer que as questões ambientais, sociais e económicos têm um impacto no valor do negócio: “Muitas vezes um valor externalizado (escondido) para a sociedade, mas a verdade é que todo o elenco regulamentar que está prestes a ser concretizado pela Comissão Europeia tem o objetivo principal de pegar nestas externalidades e torná-las evidentes e passá-las para dentro das empresas”, afinca.
A primeira edição das NEYA Sustainable Talks decorreu no passado dia 18 de maio, quinta-feira, no NEYA Porto Hotel.
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