O Porto é o distrito de Portugal com menor justiça no preço da água. Em 2021, o preço médio da tarifa variável de abastecimento de água foi o mais elevado do país, fixando-se em 1,11 euros por metro cúbico consumido, um valor que fica acima do preço médio nacional, de 0,81 euros por metro cúbico consumido.
A conclusão faz parte da sétima edição do Estudo Comparativo dos Tarifários de Abastecimento de Água em Portugal, desenvolvido pela Associação Portuguesa de Famílias Numerosas (APNF).
Apresentado esta quinta-feira, 20 de outubro, na Universidade Católica do Porto, o estudo demonstra que, no distrito portuense, o preço por pessoa aumenta à medida que a família vai aumentando, existindo, desta forma, elevadas discrepâncias consoante o local onde a família reside. Tendo em conta o índice de equidade analisado no estudo, há municípios com um bom posicionamento, mas também municípios com elevadas injustiças que se refletem na fatura das famílias. No concelho da Póvoa de Varzim, por exemplo, uma família de 10 pessoas paga 300,24 euros no total das faturas do ano, ao contrário de Gondomar em que o mesmo agregado familiar paga, pelo mesmo consumo de água, 1245,12 euros por ano.
O preço médio da tarifa fixa de abastecimento de água do distrito do Porto foi o segundo mais alto do país em 2021: 4,41 euros por mês, ultrapassando o preço médio nacional que foi de 3,16 euros por mês. O distrito de Aveiro registou a média de tarifa fixa mais elevada 4,95 euros por mês. Já o distrito de Beja foi o que registou com a média da tarifa fixa mais baixa, com 1,80 euros por mês. Na componente fixa, as discrepâncias são sentidas nos 18 municípios do distrito: em Paços de Ferreira, por exemplo, o valor da tarifa fixa é gratuito em todas as dimensões familiares, enquanto que, no concelho de Vila do Conde, este valor é de 9,97 euros por agregado por mês, a que acresce o consumo da água.
Com este estudo pretende-se alertar para a injustiça que se faz sentir nas famílias portuguesas de maior dimensão que, efetivamente, pagam mais por um copo de água do que uma família de menor dimensão. Neste sentido, a APNF recomenda uma maior justiça no aceso à água, através da “eliminação da discriminação relativa à dimensão familiar, implementando tarifários familiares corretivos”, para além de ter em “consideração a dimensão familiar”, a “garantia a acesso claros e simples à tarifa familiar” e a “redução das disparidades acentuadas no preço base da água”.
“A última palavra é dos municípios”
Mesmo com estas desigualdades, Ana Cid, secretária-geral da Associação Portuguesa de Famílias Numerosas (APNF), fala de “evolução tímidas” que têm acontecido, quando comparadas com o primeiro relatório, em 2015, à Ambiente Magazine, a responsável indica que “há mais tarifários familiares criados, há uma ligeira redução nas disparidades e há tarifários familiares que existiam que não estavam bem construídos e que foram aperfeiçoados. Apesar dos progressos tímidos, a injustiça tem diminuído e tem acontecido”, reconhece.
Sobre o papel dos municípios, a responsável nota que há uma dificuldade em fazer as pessoas compreender os dados: “Durante muito tempo, os autarcas quando anunciavam a criação das tarifas familiares diziam que a água ia ser mais barata para as famílias numerosas, mas na verdade, não se pretende um benefício, mas que a água seja ao mesmo preço”. E se o “consumo é mesmo”, deve ter o “mesmo custo”, defende Ana Cid, dando como exemplo o de “uma pessoa que vai ao supermercado” e que “compra um quilo de arroz para a sua alimentação durante um mês e paga um euro: um pai de família com cinco pessoas em casa e comprar cinco quilos de arroz vai pagar dois euros por cada quilo de arroz. É isto que se passa com o preço da água”.
Face a esta realidade, a secretária-geral da APFN defende a necessidade de se “avaliar o consumo global da habitação e dividir esse consumo pelo número de pessoas que habita aquela casa e consome e aí sim, atribuir escalões e penalizar na mesma os consumos excessivos. Mas, se não há um consumo excessivo e se as pessoas estão a consumir dentro do razoável, não é justo que tenham de pagar mais por pessoa e que o preço do copo de água seja o dobro ou triplo do preço, só porque são mais pessoas dentro da habitação”.
Já sobre a Entidade Reguladora de Águas e Resíduos (ERSAR), Ana Cid reconhece positivamente o papel do legislador: “Há muitos anos que recomenda a criação de tarifários familiares da água que assegurem que, independentemente da dimensão da família, o preço para o mesmo consumo seja o mesmo”. Além disso, tem recomendado a criação do alinhamento dos escalões que corrija este processo: “Há pouco tempo, tomamos conhecimento que eles iam rever essa recomendação, diminuindo o valor”.
Mas são os municípios que têm de dar o primeiro passo, uma vez que “têm autonomia para decidir sobre os seus tarifários”: “Têm que ser eles a perceber esta questão e têm de ser eles a corrigir os tarifários”, remata.