A Quercus discorda da intenção dos organizadores de promoverem a edição de 2016 do “Festival Marés Vivas” junto à Reserva Natural Local do Estuário do Douro e espera que o assunto possa ser resolvido fora dos tribunais. A Reserva Natural Local do Estuário do Douro situa-se na margem sul do rio Douro, junto à sua foz. Inicia-se na zona da Afurada e termina na zona arenosa do Cabedelo. Em comunicado, a Associação Nacional de Conservação da Natureza refere que esta Reserva Natural é atualmente o sítio de maior importância para a biodiversidade na região do Grande Porto e alberga mais de uma centena de espécies de aves, grande parte delas protegidas e raridades.
O local onde o “Festival Marés Vivas” se realizou desde 2008 até 2015, além de distar cerca de 1.000 m da área mais importante da Reserva Natural, continha um morro fortemente arborizado da Quinta Marques Gomes, que reduzia e moderava a propagação do ruído, pelo que o evento tinha um impacto limitado sobre as aves da Reserva, explica a Quercus.
Por sua vez, o lugar proposto para a edição de 2016 é adjacente à Reserva Natural, sendo que “o movimento de pessoas e viaturas vai, fatalmente, perturbar as espécies existentes na Reserva Natural, em plena época de nidificação das aves”, indica na mesma nota. E acrescenta: “o ruído, especialmente à noite, aterroriza as aves que voam descontroladamente e vão posteriormente ferir-se ou morrer. Prova disso foi o lançamento do ‘maior foguete do mundo’ do Porto para o Estuário do Douro. Este evento, que foi denunciado pela QUERCUS, em 2010, resultou em inúmeras mortes de aves do estuário”.
Há também a ter em conta os impactos das obras necessárias de terraplanagens nos ecossistemas locais.
Legislação Nacional e Diretivas Europeias alertam para impactes negativos nas espécies e habitats prioritários
As diretivas referentes a Aves e Habitats (n.° 79/409/CEE, do Conselho, de 2 de Abril e n.° 92/43/CEE, do Conselho, de 21 de Maio, respetivamente) transpostas para o direito português pelo Decreto-Lei n.º 140/99, de 24 de Abril, com sucessivas alterações, referem que as atividades inerentes à adaptação de locais a recinto de festival de música, como a alteração do uso e da morfologia do solo, estão sujeitas a parecer do Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB). Além disso, o diploma alerta para os impactos negativos que qualquer ação ou projeto possa ter em habitats e espécies “prioritários” e proíbe “perturbar esses espécimes, nomeadamente durante o período de reprodução, de dependência, de hibernação e de migração” e “deteriorar ou destruir os locais ou áreas de repouso dessas espécies” (alínea b) e d), artigo 11º).
Dado que a área da Reserva Natural contém tanto habitats (como estuários atlânticos, dunas móveis embrionárias e prados salgados atlânticos), como espécies de aves, “prioritários” (todas elencadas no Guia da Reserva Natural, editado com apoio do QREN, em 2012), a realização do Festival Marés Vivas neste local contraria o disposto na lei portuguesa, avisa a Quercus.
As áreas protegidas na Região do Porto são em número muito reduzido, o que realça a necessidade de conservação das mesmas. A Reserva Natural do Estuário do Douro tem um valor paisagístico e social notáveis, sendo o local de encontro de dezenas de amantes de natureza. Também é local de eleição para muitos fotógrafos de vida selvagem.
Neste sentido, a Quercus solicita aos promotores que procurem outros locais alternativos para o Festival, onde seja possível compatibilizar a realização deste evento cultural com a conservação da biodiversidade, isto na certeza de que muitos ambientalistas também são frequentadores habituais do Marés Vivas e estarão atentos a todas as medidas tomadas pela organização em defesa do Ambiente.
A Quercus apela, de igual modo, aos patrocinadores e artistas para que “repensem a sua responsabilidade social e ambiental e não aceitem o Festival no local anunciado onde, em três dias, serão destruídos anos de trabalho em prol da Conservação da Natureza”.