Na sequência da recente tomada de posição conjunta por parte da associação que representa as empresas de celulose (CELPA) e de uma organização representativa de associações de produtores de eucalipto, na qual se defende a eucaliptização de áreas de matos como meio de aumentar a resiliência do território aos incêndios florestais, a ACRÉSCIMO e a ZERO vêm manifestar o “total repúdio” por esta tentativa de criar pressão sobre o Governo para voltar a “desregulamentar as arborizações com eucalipto”, quando o que verdadeiramente está em causa é a “existência de um passivo ambiental que a indústria não tem qualquer intenção de solucionar mas sim de acentuar”.
Num comunicado, as Associações referem que “as áreas de eucaliptal mal gerido e abandonado representam cerca de dois terços da área total de eucalipto em Portugal, ou seja, 560 mil hectares de um total de ocupação oficial de 845 mil hectares – mas que rondará já, muito provavelmente, cerca de 1 milhão de hectares, com esta espécie exótica a dominar a paisagem florestal a norte do rio Tejo (dados de 2015 do 6.º Inventário Florestal Nacional)”.
Mas será que é esse aumento de resiliência do território aos incêndios florestais que está verdadeiramente em causa com a proposta de aligeirar as restrições à instalação de novos eucaliptais? Na verdade, tal como indicam as associações, o que está em causa é um “aspeto pecuniário”, ou seja, “é mais barato plantar em áreas de matos do que replantar atuais áreas de eucaliptal abandonado ou mal gerido, sendo que a diferença de custos ronda valores por hectare 50% superiores nas replantações”.
De salientar que “não é possível arborizar com eucaliptos (ação de instalar árvores de espécies florestais, por sementeira ou plantação em terrenos que não tenham sido ocupados por floresta nos últimos 10 anos), mas é possível rearborizar (ação de reinstalar árvores de espécies florestais, por sementeira ou plantação, em terrenos que já tenham sido ocupados por floresta, nos últimos 10 anos), prevendo-se que, no caso de arborização exista uma compensação com a recuperação de áreas onde o eucalipto tem menor produtividade”, refere a ACRÉSCIMO e a ZERO, considerando que “o problema é que a indústria parece não querer internalizar os custos económicos e ambientais, situação que se comprova com o facto de existiram disponíveis 45 áreas de compensação, representando estas apenas 4 167 hectares, o que cria uma pressão indesejável sobre as entidades públicas para a atribuição de um significativo volume de fundos públicos para reabilitar o enorme passivo existente”.
Acresce que a “narrativa está completamente enviesada”, uma vez que na “análise de tendência do envolvimento das áreas de matos e das áreas de eucaliptal na área total ardida, conforme os registos de 1996 a 2021, a presença das áreas de matos tem vindo a decrescer e o envolvimento das áreas de eucaliptal na área ardida total apresenta uma tendência crescente”, lê-se no comunicado.
Assim, a eucaliptização das áreas de matos, aliada à manutenção das atuais áreas de eucalipto mal geridas ou abandonadas, não só “não aumentará a resiliência dos territórios aos incêndios florestais”, como “agravará o passivo ambiental e os impactes associados às alterações climáticas”.
Por estes motivos, a ACRESCIMO e a ZERO repudiam a pressão exercida pela associação das celuloses sobre a ação governativa, baseada apenas em “interesses financeiros insustentáveis”, que colocam em causa a economia, o “bem-estar das populações, rurais e urbanas, e o património ambiental do país”.
As Associações recusam qualquer tentativa que “promova a expansão da área de plantações de eucalipto em Portugal”, lembrando que “o país já possui a maior área relativa com estas plantações a nível mundial, sendo detentor da maior área absoluta a nível europeu e a quinta a nível global, mas apresenta a produtividade média unitária mais deplorável e a maior área relativa de risco de incêndio e de propagação de pragas e de doenças”.
A ACRÉSCIMO e a ZERO exigem, ainda, ao Governo que assuma os compromissos de redução de área destas plantações em Portugal, bem como da meta, estabelecida na Estratégia Nacional para as Florestas, para atingir uma produtividade média unitária não inferior a 10 metros cúbicos por hectare e ano. Ambas estão associadas a “ações de replantação”, mas, sobretudo, de “reconversão de grande parte de eucaliptal abandonado para outras ocupações dos solos”, nomeadamente para “ações de restauro dos ecossistemas”, na “aposta em sistemas agroflorestais” e em “espécies arbóreas autóctones de maior valor ecológico e económico”, rematam.