Nos dias que correm, especialmente nos meios urbanos, passamos a maior parte da nossa vida útil no interior de edifícios, seja em casa, no trabalho ou em locais de lazer, nomeadamente, nos restaurantes, espaços comerciais e instalações desportivas.
Existe uma consciência generalizada, especialmente no período pandémico em que vivemos, que uma deficiente qualidade do ar interior tem impactos muito negativos na nossa saúde e a que estamos sujeitos a estes impactos no nosso dia-a-dia, sem que disso nos demos conta.
Assim sendo verificamos que a consciência para a necessidade de manter uma boa qualidade do ar interior é cada vez maior. Deste modo proliferou, mais do que nunca, a oferta no mercado de sistemas de monitorização de qualidade do ar interior.
Neste seguimento o que impede qualquer cidadão ou entidade, na posse de quinze euros, de adquirir um sistema de monitorização de qualidade do ar interior, que afirma medir o CO, o CO2, VOCS e formaldeído e, que ainda o informa das horas e das condições de temperatura e humidade interior?
Porque temos no mercado sistemas que podem custar dezenas de milhar de euros, a competir directamente com estes sistemas de baixo custo, à venda em qualquer plataforma electrónica?
O paradigma da avaliação da qualidade do ar interior é o resultado de uma legislação vaga e omissa.
A regulamentação sobre a qualidade do ar interior e a ventilação de edifícios em Portugal é significativa.
Existem regulamentos que incluem orientações e disposições constructivas no âmbito da ventilação dos espaços interiores, mas não é suficiente, nomeadamente na monitorização de determinados compostos (gases ou partículas) conhecidos como nocivos.
No início do ano de 2009 passou a ser obrigatório em Portugal certificar a eficiência energética e a qualidade do ar em todos os edifícios. De acordo com a Portaria 461/2007 de 5 de Junho, a partir de 1 de Janeiro de 2009, o Sistema Nacional de Certificação Energética e da Qualidade do Ar Interior em Edifícios (SCE) passou a abranger também os edifícios pré-existentes.
Acessoriamente tem-se assistido à publicação de normativos que visam combater as lacunas que subsistem e, que ainda assim não são especificamente direccionados para a questão da qualidade do ar interior.
E qual é o resultado obtido? O que impede que possamos comparar dados de um sistema indicativo com os de centrais de monitorização de qualidade do ar de empresas certificadas na área?
A resposta é simples: nada.
Enquanto não existir a definição de métodos de referência para a medida, de quais os valores-limite para cada componente, a obrigatoriedade de reporte de dados e acima de tudo uma correcta e séria fiabilidade dos equipamentos utilizados, existirá sempre uma indefinição e o paradigma de uma legislação vaga e omissa.
É necessário tratar a qualidade do ar interior da mesma forma que tratamos a do ar ambiente (exterior), separando o que são soluções domésticas de soluções profissionais e, sobretudo, garantir que as medidas obtidas na monitorização são precisas e fiáveis ao longo do tempo.
Em 2020 foi publicado um estudo, feito em Portugal, onde os investigadores analisaram a qualidade do ar em casas habitadas por recém-nascidos e concluíram que 3/4 dessas casas apresentavam partículas em suspensão no ar da dimensão PM2,5, excedendo os limites impostos pela Organização Mundial de Saúde e que 41% excediam os limites recomendados para partículas em suspensão no ar de maior dimensão (PM10).
Em consonância, nas últimas décadas, a Agência de Protecção Ambiental dos EUA (EPA), tem vindo a estudar os motivos pelos quais o nível de poluentes presentes no ar interior serem superiores aos presentes no ar exterior, sobretudo quando falamos de Compostos Orgânicos Voláteis (VOCs).
Se nada fizermos, é tão válida a informação que obtenho a partir de um smartwatch como aquela que obtenho a partir de uma central de monitorização da qualidade do ar.
Vamos fazer qualquer coisa.
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#Opinião: Partículas ultrafinas: Porque é imperioso medir? (Parte II/III)
*Este artigo foi publicado na edição 91 da Ambiente Magazine.