Alcançar a transição para zero emissões líquidas dependerá do envolvimento de empresas, governos, instituições e indivíduos em todo o mundo, exigindo uma mudança total de mentalidade, incluindo a preparação para o inesperado e para os riscos a curto prazo, mas também agir com maior determinação, unidade e habilidade, ampliando os horizontes de planeamento e investimento. As partes interessadas necessitam de acelerar os esforços atuais para descarbonizar, aproveitar oportunidades e adaptar ao risco físico decorrente das alterações climáticas. Esta é uma das conclusões de um novo relatório da McKinsey & Company, divulgado esta terça-feira, onde partilha uma visão mais ampla, quando comparado com outros estudos desenvolvidos até à data, acerca da magnitude e natureza das mudanças económicas necessárias para atingir esse objetivo: “net zero”.
A “Transição Net Zero: quanto custaria, o que poderia trazer”, avalia, desta forma, as implicações para a procura, gastos de capital, custos de produção e empregos em setores que produzem 85% das emissões totais, com uma análise detalhada realizada em 69 países, incluindo Portugal.
Para Bruno Esgalhado, sócio de McKinsey & leader of sustanabiility practice in Iberia, “a transição para alcançar zero emissões líquidas equivalerá a uma enorme transformação económica. As iniciativas encetadas por empresas, de forma individual, e por governos, juntamente com o apoio coordenado a setores, países e comunidades mais vulneráveis, podem facilitar os ajustes económicos e sociais que serão necessários”.
O estudo avalia a transição em duas dimensões: “setores e geografias”. A análise toma como ponto de partida e caminho para atingir zero emissões líquidas o cenário hipotético “Net Zero 2050”, da Network for Greening the Financial System (NGFS).
Num comunicado, a McKinsey & Company partilha as principais conclusões do relatório:
- A transição seria universal. Todos os setores económicos e países seriam afetados à medida que são revistos todos os sistemas de energia e de uso da terra que sustentam as economias e que são responsáveis por gerar emissões.
- A escala da transformação económica seria significativa. Os gastos de capital em ativos físicos totalizariam cerca de 275 biliões de dólares até 2050 – aproximadamente 9,2 biliões de dólares por ano – ou um aumento de 3,5 biliões nos gastos anuais que são hoje feitos, à medida que diminuem as atividades responsáveis por emissões elevadas e aumentam as atividades com emissões mais baixas. Por exemplo, hoje 65% dos gastos com energia e terra vão para produtos responsáveis por um elevado nível de emissões. No futuro, 70% iriam para produtos com baixas emissões e as infraestruturas necessárias, revertendo a tendência atual.
- Redistribuição massiva de mão de obra pode ser necessária, com cerca de 200 milhões de empregos diretos e indiretos gerados e 185 milhões perdidos até 2050 com a transição para “net zero”.
- As mudanças seriam antecipadas. A próxima década será decisiva. Os gastos, que hoje rondam os 6,8% do PIB, aumentariam para 8,8% entre 2026 e 2030, antes de diminuírem. Além disso, os custos de produção de eletricidade aumentariam de imediato, mas cairiam depois de atingirem o pico.
- O impacto da transição seria sentido de forma desigual entre setores, países e comunidades. Os mais expostos seriam os setores com produtos ou operações com elevados níveis de emissões; países com rendimentos mais baixos per capita e aqueles com grandes recursos de combustíveis fósseis; e comunidades cujas economias locais dependem de setores expostos. Os setores mais expostos correspondem atualmente a cerca de 20% do PIB mundial. Outros 10% do PIB estão em setores cujas cadeias de fornecimento têm emissões elevadas, como, por exemplo, a construção. Famílias com rendimentos mais baixos por todo o mundo poderão ser mais afetadas pelo aumento do custo da eletricidade a curto prazo e pelos custos relacionados com o capital que possam vir a necessitar para aquisição de produtos com emissões mais reduzidas, como novos aquecedores ou carros elétricos.
- Apesar da dimensão dos ajustes necessários, os custos e as mudanças causadas pelo aumento de riscos físicos, ou por uma transição desordenada, seriam provavelmente muito maiores. A transição acarreta riscos se não for bem gerida, inclusive de escassez de energia e de aumento de preços. Se não for feita a tempo ou ocorrer de forma abrupta, a transição aumenta o risco de ativos estagnados e de deslocalização de trabalhadores. Contudo, os resultados seriam muito piores se não for tomada nenhuma medida: alcançar zero emissões líquidas e limitar o aquecimento a 1,5 °C evitaria os impactos mais catastróficos das alterações climáticas, incluindo limitar o risco de feedback loops (ciclos de retroalimentação, que ajudam a aumentar ainda mais as temperaturas do planeta) e de preservar a nossa capacidade de interromper o aquecimento adicional.
- Uma transição ordenada oferece oportunidades de crescimento e benefícios duradouros que vão para além da descarbonização. Apesar de os impactos serem distribuídos de forma desigual, uma transição bem coordenada pagaria dividendos, incluindo o potencial para uma descida a longo prazo nos custos de energia, melhores resultados para a saúde e para a conservação do capital natural. As áreas de crescimento poderiam ser operações mais eficientes com base na descarbonização e a criação de novos mercados para produtos de baixa emissão de carbono.
Tiradas as conclusões, Bruno Esgallhado deixa um alerta: “Uma transição mais ordenada não evitaria apenas os piores impactos de um clima em mudança, mas poderia trazer enormes benefícios. Os custos de energia poderiam diminuir a longo prazo, assim como outros gastos. E a uniformização de intenções e ações que exigirá é um bom augúrio para resolver outros problemas globais. Ao mesmo tempo, os riscos a curto prazo de uma transição mal pensada não podem ser ignorados”.
Apesar dos desafios, o responsável reforça a necessidade de uma transição económica para alcançar zero emissões líquidas: “A questão agora é se o mundo pode agir com ousadia e aumentar a resposta e o investimento necessários na próxima década”.
Segundo a mesma nota, o relatório baseia-se no documento de referência realizado pela McKinsey, Solving the net-zero equation: Nine requirements for a more orderly transition, sendo uma atualização da publicação efetuada em 2020 Climate risk and response: Physical hazards and socioeconomic impacts – um compromisso da McKinsey que visa contribuir para a investigação multidisciplinar que, ao longo de um ano, se concentrou no risco físico e nos potenciais efeitos sobre as pessoas e sobre as comunidades, o capital natural e físico e sobre as atividades económicas, para além das implicações para as empresas, governos, instituições financeiras e indivíduos.