“Mitigação” e “Adaptação” são termos que ocupam lugares de destaque na cena política nacional e internacional quando se fala em alterações climáticas, mostrando que a sociedade está atenta a este tema. A investigação ambiental tem ganhado terreno e os investigadores têm sido ouvidos e tidos em conta. Mas o que é que tem sido feito para que estas palavras ganhem um significado palpável? A Ambiente Magazine foi perceber qual a importância da investigação ambiental e a sua aplicabilidade.
“Temos capacidade para fazer a melhor ciência e inovação a nível mundial”, afirma Vítor Vasconcelos, diretor do CIIMAR (Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental) e docente da FCUP, acrescentando que Portugal tem notáveis centros de investigação na área do Ambiente e excelentes recursos humanos, que contribuem para “encontrar soluções que tornem o país mais competitivo e atrativo para o investimento internacional”. O investigador destaca a necessidade de se “criarem condições para conhecer, proteger e valorizar toda a área marítima sob nossa jurisdição”, existindo “um défice de meios navais” e a falta de uma “plataforma oceânica que permita testar em situações reais soluções desenvolvidas em terra. Falta um programa nacional regular de financiamento de equipamentos para os centros de investigação, pois a maioria dos projetos e investigação não permite a aquisição de equipamentos de maior valor”, lamenta. Outra mais valia de Portugal são os “recursos humanos de excelência” que estão preparados para competir com qualquer investigador internacional: “Como em muitas outras áreas, os salários não são muito atrativos e, por isso, muitas vezes há “fuga de cérebros”. Mas vejo isso também pela positiva: permite criar redes mais fortes, pois esses investigadores acabam por atuar como embaixadores da ciência portuguesa”.
Ana Marta Gonçalves, investigadora do MARE (Centro de Ciências do Mar e do Ambiente) da Universidade de Coimbra, também dá nota positiva à investigação na área do Ambiente, classificando-a de “interventiva, dando resposta aos problemas ambientais”. A investigadora lembra que têm sido realizados “estudos de monitorização ambiental” para a “avaliação de riscos para a saúde dos ecossistemas e do ser humano”, havendo “redes e infraestruturas” que permitem “melhorar o conhecimento acerca do funcionamento dos ecossistemas portugueses”, através do desenvolvimento de um sistema de monitorização. Olhando às oportunidades da investigação ambiental, a “aproximação da ciência à sociedade” cria “colaborações e uma interface entre a academia e a sociedade” e “coloca o saber à disposição de entidades públicas”, permitindo “um maior conhecimento do território português” e contribuindo para a “conservação e sustentabilidade ambiental” e para “uma melhor qualidade de vida das pessoas”. No entanto, há ainda muito trabalho a fazer para “melhorar e fomentar uma maior aproximação da ciência à sociedade”.
Para o CEF Outreach (Centro de Estudos Florestais), o Ambiente é um dos tópicos na agenda: “Portugal tem estado sempre na dianteira da investigação em ambiente, sendo esta uma temática abordada de forma abrangente por várias áreas científicas”. Devido à “heterogeneidade ambiental”, a investigação pode ser uma “sentinela” para as alterações globais e mostrar como as medidas de gestão ambiental podem reduzir impactos futuros: “O reforço da investigação pode tornar o país numa referência internacional e num parceiro-chave em projetos internacionais”, sublinha. Ao nível dos desafios, o centro destaca o financiamento destinado à Investigação e Desenvolvimento: “As despesas nacionais de 2019 corresponderam a 1,4% do PIB, enquanto a média europeia foi de 2,2%”. O “baixo desenvolvimento do tecido empresarial”, a “falta de maturidade do sistema científico nacional” e a “falta de capacidade em manter investigação de longa duração” são também desafiantes para o país. No entanto, o CEF Outreach considera que “o ensino superior em Portugal é de qualidade, criando investigadores multifacetados, com capacidade de resolução de problemas”, mas com pouco reconhecimento: “Isto é visível na baixa incorporação dos doutorados no tecido empresarial, faltando dinâmica entre a academia e as empresas”.
[blockquote style=”2″]Investigação aliada à preservação e conservação de espécies[/blockquote]
As leis zoológicas têm-se alterado a nível europeu desde 1998, transformando os Zoos em habitats de Conservação de Espécies. Por isso, a investigação assume relevância para que os planos de conservação de espécies e ecossistemas tenham uma maior taxa de sucesso. No caso do Zoo Santo Inácio, a investigação permite “reunir informações” necessárias aos “planos de gestão das populações zoológicas” e para o “estabelecimento de medidas de conservação adequadas ao habitat natural”. Carla Monteiro, veterinária do zoo gaiense, destaca que os zoológicos oferecem uma “oportunidade única de investigação”. Uma vantagem acrescida é que o Zoo Santo Inácio é membro de associações ligadas a parques zoológicos, o que facilita a partilha de informação e o envolvimento em inúmeros projetos. Já a nível nacional, o Zoo de Santo Inácio promove ações em parceria com várias instituições. A veterinária está orgulhosa do trabalho desenvolvido: “O Zoo alberga cerca de 40 espécies ao abrigo de programas EEP, com uma taxa de sucesso reprodutivo positiva, e a transferência de mais de 170 indivíduos para outros zoos, dando continuidade à espécie”. E neste processo, os cidadãos são também atores-chave: “Poder transmitir às pessoas quem são os animais e as dificuldades que sentem na vida selvagem torna-se essencial para que possam desempenhar um papel importantíssimo de embaixadores da natureza”.
Quem parece concordar é Élio Vicente, biólogo marinho e diretor do Porto d’Abrigo do Zoomarine, partilhando que um dos desafios dos zoos progressistas é que, muitas das vezes, albergam espécies ainda pouco conhecidas para a ciência: “Muitas das dinâmicas de investigação tendem a ser diretamente dirigidas para o aperfeiçoamento das melhores práticas de husbandry, de modo a prestar as melhores condições possíveis de bem-estar”. De acordo com o biólogo, é comum muitos dos projetos incluírem entidades e investigadores de outras regiões em dinâmicas “complexas” e “aliciantes” e que se podem “prolongar por meses ou anos”. Sendo o Zoomarine uma empresa privada, “os recursos tendem a ser consideravelmente limitados”, pelo que vários dos projetos “beneficiam do imenso trabalho que é feito por outros zoos progressistas, organizações não-governamentais, universidades e centro de investigação”, numa “profunda e constante interação e transferência de conhecimentos, expetativas e competências”. A investigação é, assim, a “base” de um trabalho complexo: “Em plena Sexta Extinção em Massa, nunca o papel da investigação e o trabalho dos zoos progressistas foi tão urgente e fez tanto sentido”.
Um dos pilares da missão de um Jardim Zoológico é a investigação: “Esta é uma ferramenta essencial para aumentar o conhecimento sobre cada espécie e que se integra com os outros dois pilares da missão a que nos propomos diariamente, a sensibilização dos visitantes e a conservação”, afirma Rui Bernardino, médico veterinário do Jardim Zoológico de Lisboa. O Zoo desenvolve, igualmente, um trabalho integrado com outras instalações zoológicas através de associações, permitindo a “partilha de informação e de experiências” e que enriquece o “conhecimento global”, elevando o “sucesso dos projetos de conservação” no espaço físico do Zoo e no habitat natural das espécies. E porque a preservação estará sempre dependente da atitude das pessoas: “Todos nós vivemos na Natureza e a sensibilização para os problemas é extraordinariamente importante”.
*Este artigo foi publicado na edição 90 da Ambiente Magazine.