A ENA (Agência de Energia e Ambiente da Arrábida) deu a conhecer, recentemente, o PLAAC-Arrábida, um projeto que tem como objetivo principal a elaboração de três Planos Locais de Adaptação às Alterações Climáticas, um para cada município do território Arrábida: Sesimbra, Setúbal e Palmela. Com estes planos, a Agência pretende proporcionar aos três municípios e demais entidades da comunidade, conhecimento das vulnerabilidades e dos riscos atuais e futuros que o território enfrenta, identificar prioridades de intervenção, apoiar na avaliação da capacidade adaptativa do território, capacitar para a análise da informação, idealização e desenvolvimento de medidas que possibilitem aumentar a resiliência do território, pessoas e organizações, e a tomada de decisões conscientes.
Em entrevista à Ambiente Magazine, Sérgio Marcelino, presidente da ENA, refere que o PLAAC-Arrábida iniciou oficialmente no dia 15 de fevereiro e tem uma duração de 18 meses: “Estamos na fase de apresentação do projeto e do consórcio à comunidade, de envolvimento dos diversos parceiros locais, de caracterização da área de intervenção, o território Arrábida, nomeadamente cenarização bioclimática, sociocultural, económica e ecológica, de identificação e avaliação de riscos, impactes e vulnerabilidades”.
De acordo com o responsável, a implementação do PLAAC-Arrábida baseia-se em seis conjuntos de atividades, dos quais se destacam a “caracterização da área de intervenção”, a “avaliação de impactes e de vulnerabilidades atuais e futuras”, a “construção da estratégia de adaptação e dos planos de ação” e a “capacitação das organizações locais”, que serão implementadas em diferentes períodos. Já a “gestão administrativa e a comunicação decorrem durante todo o tempo de vida do projeto”, acrescenta.
Sendo o “envolvimento dos parceiros locais um dos principais e mais importantes desafios ao bom desenvolvimento e sucesso do projeto”, Sérgio Marcelino declara que “a comunicação, a capacitação e a formação de técnicos e decisores das diversas organizações assumem especial relevância para que os Planos locais sejam realistas e concretizados a curto, médio prazo”. É por isso que ao longo do PLAAC-Arrábida o “diálogo” e a “partilha de informação” estarão sempre presentes: “Na divulgação através dos órgãos de imprensa local e regional, na dinamização de atividades comunicativas, como sejam os pequenos-almoços informativos com representantes dos meios de comunicação, nos Websites da ENA e das entidades do consórcio, nas redes sociais e eventos, em diversos suportes físicos e virtuais como sejam banda desenhada, para a divulgação dos planos entre os jovens em idade escolar, artigos e pósteres científicos”.
Relativamente às metas a considerar nos Planos de Adaptação, o presidente da ENA refere que estão ainda em “fase de definição”, uma vez que estão em curso a “caracterização, cenarização e avaliação de impactes e vulnerabilidades climáticas” que permitirão “identificar caminhos e conceber medidas que serão discutidas e avaliadas”, nomeadamente em termos de “custo-benefício”. Ainda assim, há medidas que inevitavelmente deverão constar dos planos: “Por exemplo, no que toca ao calor excessivo: sombreamentos. Relativamente à erosão: alimentação artificial, dunas artificiais, vegetação dunar. Em caso de cheias: bacias de retenção, entre outras a identificar”.
Questionado sobre os principais riscos climáticos que estes três concelhos enfrentam, o presidente da ENA consta que a localização e orografia de Sesimbra, Setúbal e Palmela, apresentam riscos comuns, como é o caso dos “incêndios rurais ou florestais, calor excessivo e seca meteorológica”. E dadas as especificidades de cada um, há riscos que estão sujeitos apenas a Sesimbra, tais como a “erosão hídrica do solo”, a “instabilidade de vertentes”, as “inundações e galgamentos em litoral arenoso”, a “erosão e recuo de arribas e a tempestade de vento”. No caso de Palmela estes riscos passam ainda pelas “inundações estuarinas” e, em Setúbal pela “instabilidade de vertentes, as cheias fluviais rápidas, as inundações estuarinas, as inundações e galgamentos em litoral arenoso e a erosão e recuo de arribas”, atenta.
O presidente da ENA não tem dúvidas de que estes planos, “consistentes com a estratégia de desenvolvimento local e planos diretores municipais”, vão desempenhar um papel crucial na adaptação às alterações climáticas, nomeadamente por “envolverem diversos setores e agentes da comunidade na sua construção e implementação” e por “considerarem ações e intervenções que se baseiam na análise crítica do espaço e que envolvem não só questões legais e regulamentares”. A isto acresce ainda o “desenvolvimento e utilização do solo, questões institucionais, técnicas e sociais e utilização de recursos através dos quais as estruturas são implementadas e transformadas, contribuindo para a criação de paisagens e territórios mais resilientes”, destaca.
[blockquote style=”2″]O Governo tem que estar na linha da frente e criar condições para que as autarquias consigam responder aos desafios[/blockquote]
No combate às alterações climáticas, Sérgio Marcelino constata ainda que a “oportunidade de redução da poluição e dos efeitos do aquecimento global” está, essencialmente, nas infraestruturas adequadas, planeamento urbano e estratégias de mobilidade: “Municípios inteligentes em termos de clima podem reduzir as emissões de carbono e estimular o crescimento económico, uma vez que para além de possuírem capacidade e conhecimento para desenvolver um futuro de baixo carbono, é também do seu interesse”. Por outro lado, sustenta o presidente da ENA, os responsáveis municipais podem “implementar soluções específicas no contexto das alterações climáticas recorrendo a medidas diretas” como sejam “intervenções e investimento em matéria de mitigação, incentivos dirigidos a agentes da comunidade e cidadãos, liderando pelo exemplo”, dando origem a uma “cultura de sustentabilidade na utilização dos recursos”, garantindo que “todos são envolvidos”.
Olhando ainda para o papel dos municípios, Sérgio Marcelino acredita que os mesmos podem contribuir para a diminuição dos riscos associados às alterações climáticas enfrentados por cidadãos e empresas, mediante o “investimento na melhoria de infraestruturas e serviços” e do “desenvolvimento de políticas e incentivos que influenciam as ações de terceiros”. Desta forma, “o esforço de compreender e reduzir riscos e vulnerabilidades melhora a competitividade económica dos municípios”, além de que uns municípios serem “mais resilientes” do que outros pode torná-los “mais atrativos para o estabelecimento de empresas e o desenvolvimento de oportunidades de negócios”, constata. E os “benefícios” que as empresas trazem aos municípios, incluindo a “criação de empregos, receitas fiscais e serviços”, são impulsionadores dos municípios para “melhorar a sua resiliência às alterações climáticas”.
Apesar de ser já reconhecido o papel crucial que os municípios desempenham em matéria de desenvolvimento sustentável, há ainda desafios a enfrentar: “Os municípios necessitam de maior empoderamento e maior capacidade financeira, dado o seu papel indispensável na contenção das alterações climáticas”. Assim, o presidente da ENA defende a necessidade de se “criarem sinergias mutuamente benéficas” entre municípios, Governo, empresas e a sociedade civil, “enfrentando as ameaças” com uma “abordagem criativa e reforçando o papel das autoridades locais”. Um ano depois do início de uma pandemia que mudou os municípios, Sérgio Marcelino chama a atenção para importância de se perceber “O que é que estas transformações realmente significaram no contexto da mitigação e adaptação às alterações climáticas; Qual tem sido o papel da tecnologia e da inovação neste período; E quais são as principais mutações que continuarão a transformar as nossas cidades”. E nesta nova forma de estar, os municípios, o Governo, as empresas e a sociedade civil ganham protagonismo: as autoridades locais assumem a dianteira, promovendo “políticas que favorecem economias em rede e benefícios de escala em ambientes densamente povoados”; as empresas juntam-se ao processo, apostando na “alteração do modelo económico, tendo em conta critérios de circularidade”; e, por fim, a sociedade civil, “que é chamada a adaptar-se a novas realidades e em cujas mãos está a possibilidade de mudança de comportamentos e de tomada de decisões mais respeitadoras do ambiente que partilhamos”. Por outro lado, este processo só é possível, de acordo com o responsável, se se considerar as “novas tecnologias no processo produtivo, na prestação de serviços básicos como saúde, educação ou abastecimento de água e energia”, fazendo a “transição de negócios e empresas para um mundo digital” e “estimulando a aquisição de competências digitais e tecnológicas entre cidadãos”. Para o presidente da ENA, a questão não passa por “o que falta fazer para que os municípios sejam parceiros”, mas pelo “o que é necessário fazer para que a contenção e o combate às alterações climáticas seja uma realidade”. E neste combate, o Governo tem que estar na “linha da frente” e “criar condições para que as autarquias consigam responder aos desafios”, sendo que “não basta anunciar medidas”, alerta.
Portugal vai conseguir cumprir com as metas às quais está comprometido?
Mesmo que a adaptação seja essencial, as medidas adaptativas não reduzem as emissões de gases com efeito de estufa na atmosfera e, portanto, não restringem o problema a longo prazo. Esta situação desafia Portugal não apenas a adaptar-se às contrariedades atuais, mas também compelido a implementar medidas de mitigação para reduzir efetivamente os efeitos das alterações climáticas e cumprir as metas definidas. O efeito da pandemia foi especialmente duro com as camadas mais vulneráveis da população, pelo que devemos priorizar apoios a estratos da comunidade com baixos rendimentos, nomeadamente trabalhando no sentido de erradicar a pobreza nas suas mais diversas expressões, das quais destaco, pela temática da questão colocada, a pobreza energética, que decorre de outras situações de vulnerabilidade.
Financiado através do Programa “Ambiente” do EEA Grants, iniciativa criada pela Noruega, Liechtenstein e Islândia, o PLAAC-Arrábida conta assim com um consórcio liderado pela ENA e de que fazem parte as Câmaras Municipais de Sesimbra, Setúbal e Palmela, o Instituto de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Lisboa (IGOT) e a Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (FCT-Nova). O Orçamento total do projeto é 165 289,00 €, com financiamento de 90% pelo Programa “Ambiente” do EEA Grants e os restantes 10% garantidos pelas entidades que fazem parte do consórcio.