A Covid-19 trouxe um conjunto de novos aspetos ao setor dos resíduos e é fundamental tirar lições para o futuro. Foi precisamente sobre “Perspetivas para o Setor dos Resíduos, um olhar sobre os efeitos da pandemia” que a APEMETA (Associação Portuguesa de Empresas de Tecnologias Ambientais) se debruçou para mais um webinar.
Das recomendações que foram anunciadas, Paulo Praça, presidente da direção da ESGRA (Associação para a Gestão de Resíduos), começou por destacar as orientações direcionadas aos “resíduos do Grupo III”, onde “passamos a poder receber, nos nossos contentores, resíduos de pessoas que, eventualmente, estavam contaminadas no contexto de domicílio”; a “suspensão de modelos de tratamento”; a “obrigação de uma quarentena para os resíduos recicláveis, que se estabilizou nas 72h”; o “reforço visível para a população das medidas de higiene no trabalho para os colaboradores”, de forma a garantir um “serviço público essencial”.
Há muito que se fala em “metas” e “ambições” e ficam “esquecidas” funções que podem ser determinantes: “Esta pandemia veio recordar-nos que o setor dos resíduos é um serviço público essencial” que foi “confrontado com uma situação nova”, afirma o responsável.
GESAMB: “Aquisição de equipamentos de proteção individual foi a maior dificuldade”
Também Cátia Borges, diretora-geral da GESAMB (Gestão Ambiental e de Resíduos, EIM), considera que, após este período de emergência, é fundamental que haja uma “reflexão sobre o que podemos fazer melhor”. No início de março, pairava a “incerteza” e o “medo” entre trabalhadores, diz a responsável, sublinhando que foram, desde logo, elaborados planos de contingência, assegurando que todos estavam esclarecidos sobre o vírus. “Em nenhum momento houve quebras de serviço em termos de recolhas”, atenta a responsável, destacando que o período de emergência foi uma “descoberta em termos de trabalho, de resiliência e capacidade de adaptação ao setor”. Seguindo as orientações da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), a GESAMB reforçou determinadas operações, através da “reafetação de pessoal”, não só ao “aterro” mas também às “ações de higienização e desinfeção de espaços comuns”. A reafetação do pessoal deveu-se à “suspensão do processamento de resíduos indiferenciados” que “duplicou a quantidade de resíduos colocados em aterro”.
A aquisição de equipamentos de proteção individual foi a maior dificuldade para a GESAMB: “Foi um trabalho constante de pressão sobre os fornecedores que não conseguiam concretizar as encomendas”, refere a responsável, sublinhando que, só em abril é que conseguiram obter os equipamentos. “Descobrimos esta capacidade de resistir e adaptar sem falhar”, sublinha Carla Borges, reforçando a “importância do trabalho que este setor faz”.
No que se refere à evolução de quantidade de resíduos, a responsável atenta na necessidade que houve de “organizar circuitos de recolha seletiva”, uma vez que alguns “ecopontos enchiam muito mais do que outros”, notando assim uma “melhoria nesta área”. Já no indiferenciado, Carla Borges afirma que, no “primeiro trimestre”, os números eram de crescimento, mas, em abril, a queda situou-se nos 3%: “Aquilo que se perspetiva no futuro, em termos de evolução deste fluxo, é que venha a cair, fruto da crise económica que se avizinha”.
“O setor esteve à altura até hoje e respondeu ao desafio colocado”
Dentro deste tema, a situação portuguesa é igual à dos restantes países da União Europeia: “Desde o início que se percebeu, com muita clareza, que a gestão de resíduos urbanos ia ser um setor estratégico para enfrentar esta crise”, no sentido de garantir a “celeridade e saúde pública” de todos os trabalhadores. A afirmação é de Feliz Mil-Homens, assessor da direção da AVALER (Associação de Entidades de Valorização Energética de Resíduos Sólidos Urbanos), que destaca o objetivo claro, enunciado no estado de emergência, de “manter a gestão de resíduos a funcionar salvaguardando a segurança de todos”.
De forma a responder aos objetivos, a APA e a Entidade Reguladora estabeleceram regras para “minimizar o contacto humano com os resíduos”, avaliada como uma “condição importante” para manter o “sistema a funcionar”, tendo sido “decretada a redução da atividade de alguns equipamentos”, exemplifica o responsável. Assim, as determinações por toda a Europa fundamentaram-se numa divisão dos resíduos: “Os que podem ser reciclados com segurança, devem continuar a ser reciclados. Todos os resíduos que não possam ser reciclados com garantia de segurança devem ir predominantemente para a valorização energética de resíduos”. Já os países que não têm essa capacidade, como é o caso de Portugal, Feliz Mil-Homens refere que tiveram que recorrer aos “aterros sanitários”.
Dada a responsabilidade da valorização energética de resíduos no quadro desta pandemia, ficou determinado que as Centrais teriam de estar em funcionamento, cumprindo a função que lhes estavam atribuídas. No entanto, em março, foram identificados alguns receios, nomeadamente com as equipas de operação das Centrais: “Sendo equipas especializadas e reduzidas, não era possível encontrar facilmente equipas de substituição”, se a situação o exigisse.
Passados dois meses, a avaliação do responsável é positiva: “O setor esteve à altura até hoje e respondeu ao desafio colocado”. A apreciação de Feliz Mil-Homens é válida para todo o setor da gestão de resíduos, que recebeu uma “atenção especial” nesta luta contra a pandemia: “É notável o trabalho feito” entre todas as partes envolventes, até porque “os resíduos continuam a ser recolhidos todos os dias”.