Uma campanha liderada pela New Economics Foundation (NEF) e pela Our Fish convidou hoje a União Europeia (EU) e os Estados-Membros a incluírem o fim da sobrepesca nas suas leis do clima, depois de um novo estudo ter constatado que os “países da UE sobrepescaram 8,78 milhões de toneladas de pescado nos últimos 20 anos”, pode ler-se no comunicado enviado pela Sciaena.
De acordo com a análise histórica divulgada pela NEF, os países, Espanha, Irlanda, Portugal, Holanda e Alemanha estão no topo da “liga da sobrepesca”, tendo a maior percentagem de quotas definidas acima dos níveis recomendados cientificamente nos últimos 20 anos (35%, 24%, 23%, 23% e 22%, respetivamente), enquanto o Reino Unido, a Dinamarca e Espanha receberam o máximo em termos de excesso de tonelagem (1,78 milhões, 1,48 milhões e 1,04 milhões de toneladas, respetivamente).
“Se a UE cumprir seu compromisso de acabar com a sobrepesca e restabelecer os stocks pesqueiros afetados para níveis sustentáveis, poderá criar mais de 20 000 novos empregos, fornecer alimento a 89 milhões de pessoas e gerar 1,6 mil milhões de euros a mais de receita anual”, disse Griffin Carpenter, investigador sénior da NEF. “Em vez disso, todos os anos, os ministros das pescas da UE estabelecem limites de pesca acima dos melhores pareceres científicos disponíveis, tendo chegado ao ponto de ignorar o próprio prazo legal da UE para 2020. Para poderem obter mares sustentáveis, estes ministros devem acabar com esta prática e respeitar a legislação europeia, seguindo os pareceres científicos”.
A análise mais recente, uma parte do relatório Landing the Blame da NEF sobre os limites anuais de pesca acordados (Totais Admissíveis de Captura ou TAC) para os stocks comercialmente explorados na UE, descobriu que, em média, entre 2001 e 2020, 6 em cada 10 TAC foram estabelecidos acima do parecer científico. Embora a percentagem de excesso sobre cada TAC acima do parecer tenha diminuído ao longo deste período (de 39% para 10% em todas as águas da UE), a proporção de TAC estabelecidos acima dos pareceres teve uma diminuição menos evidente, passando de 8 em cada 10 TAC para 5 em cada 10.
“Como a crise da COVID-19 veio demonstrar, a destruição sistemática da natureza provocada pelo ser humano ameaça dramaticamente a saúde do nosso planeta e das pessoas. A análise Landing the Blame da NEF traz à tona os dados que demonstram que, ao sobrepescar quase 9 milhões de toneladas de pescado em 20 anos, os ministros da pesca da UE continuam a minar radicalmente o oceano, um ecossistema único que nos oferece a melhor das proteções contra as alterações climáticas”, afirmou Rebecca Hubbard, diretora de campanha da Our Fish. “A Comissão Europeia e os líderes da UE devem prestar atenção à seriedade desta situação – o oceano passar potencialmente de aliado a inimigo, se não aliviarmos a pressão –, e finalmente acabar com a sobrepesca, consagrando este objetivo no Pacto Ecológico Europeu e priorizando a finalização das Estratégias da Biodiversidade e Farm to Fork com toda a urgência”. acrescenta.
O que diz o relatório sobre Portugal?
Os dados demonstram que Portugal, em média, recebeu quotas 23% acima dos pareceres científicos, colocando Portugal em 3.º na “liga da sobrepesca”, apenas atrás de Espanha e da Irlanda. Entre 2001 e 2020, foram atribuídas a Portugal cerca de 212 000 toneladas acima dos pareceres científicos e, para 2020, 9 TAC (dos 24 avaliados) foram definidos também acima dos pareceres. Se estas quotas forem utilizadas, o prazo de 2020 para acabar com a sobrepesca não será cumprido.
Numa análise sobre espécies, é possível perceber que algumas quotas são consistentemente definidas acima dos pareceres, como é o caso da pescada, linguado e solha nas águas do Mar Cantábrico e ibero-atlânticas. Nos últimos anos, o TAC de carapau das águas do Sul, da qual Portugal é o maior utilizador, foi definido em linha com os pareceres científicos e a biomassa aumentou, assim como as capturas.
No mesmo comunicado, coordenador executivo da ONG portuguesa Sciaena, Segundo Gonçalo Carvalho, diz que “Portugal deve deixar para trás o seu passado de uma grande nação pesqueira de longa distância e concentrar-se na sustentabilidade dos recursos pesqueiros e marinhos próximos da sua costa”, acrescentado que “pescar em linha com (ou mesmo abaixo) os pareceres científicos não é apenas a forma mais segura de garantir um sector sustentável, mas também uma das melhores e mais diretas formas de aumentar a resiliência dos ecossistemas marinhos e combater as alterações climáticas”.