No segundo dia das 11as Jornadas Técnicas Internacionais de Resíduos (11JTIR), a Associação Portuguesa de Engenharia Sanitária e Ambiental (APESB) trouxe para cima da mesa um novo debate: sobre o tema “Licenciamento de Operadores de Gestão de Resíduos”, pretendeu-se discutir a organização do setor, tendo como “pano de fundo” a diversidade das entidades que existem no setor em múltiplas fileiras mas todas orientadas para o objetivo comum de “contribuir para um setor mais eficiente, mais sustentável e que promova a circularidade da economia”.O debate foi moderado pelo investigador da Universidade Nova de Lisboa (UNL) Rui Santos.
Setor dos resíduos “ainda carece de muita atenção e evolução”
Filomena Lobo, da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR), começou por orientar a sua apresentação dando uma visão sobre a forma como o setor está organizado: atualmente, a recolha seletiva é feita por 28 entidades gestoras em baixa (responsáveis pela reposição de resíduos) e por 19 entidades gestoras em alta (recebem os resíduos das entidades gestoras em baixa, ficando responsáveis pelo tratamento dos mesmos). Ao longo dos anos, foram criadas mais de 40 entidades gestoras em alta e, desde 2012, após algumas se terem agregado, “estão estabilizadas em 19 entidades”, explica a responsável, acreditando que, ao longo do tempo, se “fez um bom trabalho”. No entanto, aponta que “há ainda um potencial de melhoria significativa”, sendo importante a “legalidade de todos estes operadores de gestão de redes”. Além disso, Filomena Lobo indica que existe legislação com um “conjunto de disposições que têm de ser cumpridas”. Neste sentido, a ERSAR já publicou dois regulamentos (o “Regulamento de procedimentos regulatórios” e o “Regulamento de relações comerciais”) mas, neste momento, “nem todos estão efetuados nem adaptados”, atenta, notando cada vez mais a existência de dúvidas em relação a “quem compete o quê”, tornando-se difícil “ser juiz numa causa em que não existe lei”.
Relativamente às entidades gestoras em baixa, a responsável afirma que se tem notado alguma evolução no setor, nomeadamente na qualidade do serviço definida pela ERSAR que tem “obrigado estas entidades a conhecerem os seus dados” e “verem fragilidades com potencial de melhoria”, considerando que “ainda não temos dados económicos fidedignos” onde seja possível “criar cenários de melhorias para o setor”. O setor dos resíduos “ainda carece de muita atenção e evolução”, sublinha a responsável. Quando as entidades gestoras em alta e em baixa “começarem a sentar-se à mesa” para “discutir” sobre os regulamentos e os contratos, “vão-se aperceber da necessidade que existe de uma maior agregação destes sistemas” e, sobretudo, nas “vantagens que podem surgir”, sustenta.
Legislação ambiental é “cada vez mais exigente em todos os domínios de atividade”
A representar a Comissão e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC), esteve o vice-presidente António Veiga Simão que começou por destacar o “Regime Lua”, um instrumento onde foram “redefinidos os elementos introdutórios do processo de licenciamento” e que “veio obrigar a um maior rigor na elaboração de projetos, na sua análise e na aprovação” pelas entidades licenciadas, e o “Unilex”, que “veio também alargar o princípio da responsabilidade do produtor”.
Sobre o papel da CCDR, o responsável refere que a entidade tem trabalhado na tentativa de ser mais “capilar” no processo de licenciamento, assim como “verificar melhor as abrangências por outros regimes ambientais” e uma “maior articulação com outras entidades”. O responsável destaca ainda as “vistorias que foram alertadas” e sempre “acompanhadas por técnicos representantes das entidades que se manifestaram no âmbito da análise do projeto”, além da tentativa de, para além do “Lua” e do “Unilex”, tentarem “corrigir algumas situações que internamente foram identificadas com debilidades no âmbito do licenciamento”, tendo aqui “desenvolvido um grande trabalho” sempre na prossecução do interesse público. “É evidente que há situações de confronto entre operadores”, afirma, considerando ser fundamental o “bom senso” mas o “interesse público nas atividades de licenciamento tem de estar em primeiro lugar”, acrescenta.
Para António Veiga Simão, a legislação ambiental é “cada vez mais exigente em todos os domínios de atividade” e a CCDR está “comprometida com os desígnios do desenvolvimento sustentável” e, particularmente, com a sua “agenda regional para a economia circular que se encontra em elaboração”, reconhecendo a importância dos “operadores de gestão dos resíduos” como intervenientes fundamentais para a “concretização dos objetivos do desenvolvimento sustentável e da economia circular”, sustenta. No entanto, “temos de assegurar que as operações desenvolvidas respeitem todos os princípios ambientais aplicáveis”, remata.
“A convivência é inevitável e sem ela a Economia Circular não acontecerá”
Na intervenção de Jaime Braga, assessor da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), ficou bem patente a ideia de que os “resíduos deixaram de ser resíduos”, passando a ser designados por “recursos”. Relativamente ao licenciamento, o responsável afirma ser um “defensor do licenciamento ambiental”, considerando-o como “fundamental”. Neste sentido, as associações que representam o setor dos operadores de gestão de resíduos devem ter uma compilação de toda a informação, principalmente para os operadores de menor dimensão. “Requere-se um conjunto de diplomas”, defende o assessor, de forma a que, no “conjunto dos processos de licenciamento e até no cumprimento das obrigações, haja uma maior coerência”, até porque, “muitas vezes, os diplomas legais não são simples de ler e o cruzamento não é nada linear”, originando em muitos casos “confusão”, alerta. Para Jaime Braga, as Associações “não estão a ser convenientemente ouvidas”, sendo estas o “garante saudável” e o “equilíbrio” relativamente aos interesses que existem neste mercado.
Já sobre a Economia Circular, o responsável considera ser necessário a “convivência” entre mercados de resíduos e simbioses industriais. “É preciso haver um começar pela lei e pela estrutura do enquadramento operativo do cumprimento da lei”, afirma, destacando a importância de “mecanismos” que permitam a convivência entre as duas realidades. “A convivência é inevitável e sem ela a Economia Circular não acontecerá”, precisa, alertando que “não se faz nem com leis nem com licenciamentos”. Jaime Braga vai mais longe, deixando bem presente que a “Economia Circular só acontecerá de um modo competitivo e positivo para o país se existir sempre clareza e transparência nas transações”.