Em dezembro de 2015, a Comissão Europeia adotou um plano de ação para “os 25” sobre a economia circular, criando alterações profundas do modelo organizacional da economia. Foi com o objetivo de debater sobre as oportunidades para desenvolver novas atividades com valor acrescentado significativo para a sociedade e responder de forma positiva ao desafio societal, que a Associação Portuguesa de Engenharia Sanitária e Ambiental (APESP) incluiu como Tema Especial no programa das 11ªs Jornadas Técnicas Internacionais de Resíduos (11JTIR) a “Economia Circular: Novos Modelos, Novos Negócios”.
Para dar início à conversa, o presidente da Associação Internacional de Resíduos Sólidos (ISWA), Antonis Mavropoulos, defendeu que “uma nova indústria cria uma nova economia e, por sua vez, uma nova economia cria uma nova sociedade”, indicando que “estamos numa era de transição” em que “temos de perceber como adaptar as nossas sociedades e os nossos negócios”. O dirigente acredita que a “nova era” não tem só a ver com tecnologia mas sim com a geopolítica mundial: “Há poucos anos, era impossível tomar medidas contra os grandes exportadores de resíduos, mas agora, é possível”, sublinha.
Centrando a sua apresentação numa “revolução industrial 4.0”, Mavropoulos preocupou-se em perceber se a economia circular será a melhor para o planeta. “Dentro de 15 anos, teremos uma transformação em simultâneo, quer do conceito de “resíduo” em si, quer da sua indústria de gestão”, afirma. Para o dirigente da ISWA, a revolução está a criar novos caminhos: “está a criar uma nova economia, novos modelos de negócio, novas políticas”, sustenta, acrescentando que há mudanças “a acontecer” no setor, como a introdução de inteligência artificial ou da chamada “internet das coisas”.
Contudo, “nesta revolução, temos de ser cautelosos”, até porque “ainda não se sabe se a sociedade que está ser criada será melhor ou pior”, alerta o responsável acreditando que vai “depender das opções políticas”. Sustentando que a transformação maior se dá ao nível dos produtores de desperdício, Mavropoulos refere que estes são os “derivados da revolução 4.0”, levando o responsável a admitir que o fim dos resíduos não existe. “Tudo depende dos modelos de negócio e de quem os controla”, acrescenta. Além disso, o responsável diz que é necessária “uma nova gestão de resíduos, senão, não tiraremos dividendos da revolução 4.0”. O mesmo acontece na economia circular até porque, segundo o presidente da ISWA, este não é um “exemplo cientificamente concreto. Ainda não é ciência”, afirma. Para Mavropoulos, “os negócios nunca serão circulares”.
Modelo de economia linear “não é o futuro”
Já Martin Brokelhurst, representante da “Chartered Institution of Wastes Management” (CIWM), começou a sua intervenção com os dados mundiais de resíduos e de gestão industrial de recursos a nível mundial, com mais de quatro mil milhões de toneladas de resíduos gerados, além de destacar a extinção de espécies e as alterações climáticas. “Isto não é sustentável. Isto vai destruir o nosso planeta”, alertou, referindo que estas alterações “estão a afetar a produção alimentar”.
Defendendo que o modelo de economia linear “não é o futuro”, o investigador indica que a economia circular regista “a nível mundial cerca de 9%” e que “a Europa está a fazer melhor do que a média, cerca de 12%”, precisa. Mas Martin Brokelhurst sustenta que “não é suficiente”. O representante da CIWM acredita que é “uma oportunidade para crescimento, mais empregos e prosperidade económica”, apesar de ser uma “mudança difícil” de se fazer. “Posso mostrar casos de sucesso mas os principais negócios não nos estão a ouvir”, afirma, considerando mesmo que “existem muitas áreas que precisam de mudar”. O investigador considera ser “moralmente errado” exportar resíduos para outros países em desenvolvimento. “Porque é que ficamos surpreendidos quando enviamos resíduos para estes países e depois encontramos plásticos no ambiente?”, questiona, sustentando que “quando olhamos para os 10 principais rios do mundo em que encontramos plásticos, todos eles passam por regiões em desenvolvimento. Não é um problema de há 20 anos: é um problema atual”, afirma.
Afirmando que “é necessário mudar o paradigma” e que existem potencialidades de negócio por explorar, Brokelhurst deu o exemplo do combustível “limpo” que está a ser produzido no setor da aeronáutica ou das marcas que estão a substituir as embalagens de plástico por plástico reciclado: “É o início: é um grande passo em frente”, considera.
BEI apoia apenas projetos sólidos e aceitáveis
Para falar sobre os apoios financeiros à transição da Economia Circular (EC), Patrick Dorvil, do Banco Europeu de Investimentos (BEI), começou por indicar os setores elegíveis para o financiamento de projetos nesta vertente. Desde logo, os que “ajudam o meio ambiente” com o objetivo de reduzir as “matérias-primas virgens” e as “emissões para o solo, água e ar” são uma aposta, afirma, acrescentando também o apoio dado a projetos ligados à inovação, com “tecnologias” e “modelos de negócio inovadores”, e a projetos implementados em Pequenas e Médias Empresas (PME´s). No entanto, Patrick Dorvil refere que apenas os “projetos sólidos e aceitáveis” são financiados.
Um dos exemplos de projetos nacionais apoiados pelo BEI é a EGF Resíduos. Representando um investimento total de 416 milhões de euros, o apoio do BEI cifrou-se num empréstimo de 145 milhões. Este financiamento serviu para “racionalizar e melhorar o lixo municipal” em várias regiões de Portugal, indicou Dorvil, além de “eliminar gradualmente o aterro de resíduos biodegradáveis” e de contribuir para que as “informações dos sistema estejam em total conformidade com as normas da União Europeia”. O dinheiro investido serviu também para reduzir os “efeitos adversos no meio ambiente e na saúde pública” e proceder à recuperação de “materiais secundários”, além de potenciar a geração de energia renovável.
Detido pelos estados-membros da União Europeia, o BEI tem como objetivo ajudar a “fazer a ponte de financiamento”, estando, neste momento a catalizar “ “investimentos na Economia Circular, contribuindo também para um melhor desenvolvimento do projeto e consciencializar sobre o tema”. Uma das próximas linhas de ação do banco será a “criação de uma rede de parcerias” para “apoiar a construção e a tomada de decisões” sobre futuros projetos.